sexta-feira, 29 de outubro de 2010

SALVADOR DALÍ


1904-1989
“A única diferença entre os loucos e eu”, dizia Dalí, “é que eu não sou louco.”

“Quando tinha seis anos queria ser cozinheiro e, aos sete, Napoleão. Desde essa época minha ambição foi aumentando sem parar”, escreve DALÍ em sua “Vida Secreta.”

“Um dia de Reis, diz, recebi entre inumeráveis presentes uma deslumbrante vestimenta real, coroa de ouro com grandes topázios e capa de arminho; desde aquele momento vivi, quase que constantemente, ataviado com esse disfarce”.

“Os seres sem imaginação empreendem, incansavelmente, viagens em volta ao mundo; todos necessitarão toda uma guerra européia para adquirir uma ideia muito vaga do inferno. Tudo o que eu necessitava, para descer ao “inferno” era um pouco de muco, e além disso, um pouco de muco falso! Além disso, a Espanha que me conhecia e me conhece já sabe: se eu morresse, e não importa de que modo, embora morresse devido a um pedaço de muco ou de falso muco, sempre morreria por ela, por sua glória. Pois, diferentemente de Átila, sob cujas pisadas a erva nunca crescia, cada pedaço de chão onde coloco meus pés é um campo de honra”.



I – VIDA:

Salvador Dalí é sem dúvida, o mais importante dos artistas surrealistas. Estudou em Barcelona e depois em Madri, na Academia de San Fernando.
Foi expulso da escola em 1926; DALI, afirma que era por se negar a ser examinado por um tribunal de história da arte menos inteligente que ele. Nessa época teve oportunidade de conhecer Lorca e Buñuel. Suas primeiras obras são influenciadas pelo cubismo de Gris e pela pintura metafísica de Giorgio De Chirico.
Finalmente aderiu ao Surrealismo em 1928 quando chegou à Paris, junto com seu amigo Luis Buñuel, cineasta e realizou dois filmes “O Cão Andaluz” (1930) e a “Idade de Ouro” (1931). Com o filme “O Cão Andaluz”, criou o conceito de “paranóia crítica” para referir-se à atitude de quem recusa a lógica que rege a vida comum das pessoas. Nessa época tinha um estoque de fobias para pintar.
Tinha pavor de insetos, de atravessar ruas, trens, barcos e aviões, de pegar o metrô e até de comprar sapatos, porque não suportava mostrar seus pés. Era tomado por risos histéricos e incontroláveis e sempre carregava consigo um pedaço de madeira para afastar os maus espíritos.


Segundo ele, é preciso “contribuir para o total descrédito da realidade”. No final dos anos 30 viajou várias vezes para a Itália a fim de estudar os grandes mestres. Instalou seu ateliê em Roma. Conheceu Sigmund Freud em Londres e 1942 publicou sua biografia “A Vida Secreta de Salvador Dalí”.
Casou-se com Gala, ex-mulher do poeta e amigo Paul Éluard, a russa Helena Diarahov Diakonova, sua sempre eterna musa e soberana administradora de seus talentos e crescentes bens.


Desde a época de sua fecunda estância nos Estados Unidos, Gala presidiu tudo na vida e na obra de Dali.
Gala serve mais do que modelo para os corpos femininos nus; ela aparece diante do Crucificado; é Maria de Port Lligat; a própria Leda “atômica”; ela chega com os descobridores da América, bem ao alto, levada em seu grande estandarte ou bandeira, como a Imaculada Conceição e mostra “sintomas rinocerônticos”.


Gala é tal como titularia Dali em 1945, “Minha Mulher Nua Contemplando Como Seu Corpo se Converte”, nu e de costas, em “Degraus, Três Vértebras de Uma Coluna, Céu e Arquitetura”.
Com ela, é capaz de encontrar o legendário “Dourado” da América.


Em 1948, decide retornar à Espanha e faz pública a sua renúncia à sua anterior condição de anarquista, revolucionário e irreverente blasfemo.
DALÍ era chamado de palhaço, ator, exibicionista, comerciante, farsante, engana-bobos, inautêntico, literário...


A partir de 1970 até a sua morte dedicou-se ao desenho e à construção de seu museu.


Teatro-Museu Dalí

Além da pintura ele desenvolveu esculturas e desenho de jóias e móveis. No Museu Dalí em Figueres, Catalunha, Espanha, onde está a exposição permanente da coleção de Salvador Dalí, encontra-se além do conjunto de 39 jóias, criadas pelo artista, a sua mais famosa jóia a "The Royal Heart", trabalhada em ouro e incrustada com quarenta e seis rubis, quarenta e dois diamantes e quatro esmeraldas, criada de forma que o centro assemelha-se a um verdadeiro coração.

DALÍ deixava uma tela ao lado da cama, olhava bem para ela antes de dormir e, ao acordar, registrava o que ele chamava de “fotografias de sonhos pintadas à mão”.
DALÍ diferia de ERNST e MIRÓ na medida em que, em vez de inventar novas formas para simbolizar o inconsciente, representava suas alucinações com meticuloso realismo.
Sua técnica é apurada a ponto de ter uma precisão miniaturista, mas ele distorcia objetos de uma forma grotesca e os colocava em irreais paisagens de sonho.
Para entender a obra de Salvador Dalí, é preciso conhecer os simbolismos recorrentes de suas pinturas:
Relógio Fundido - Sugere a Teoria de Einstein, onde o tempo é relativo, a preocupação humana com o tempo e a memória.
O Elefante - Uma distorção do espaço.
O Ovo - pré-natal, o mundo.
A Formiga - morte, decadência, imenso desejo sexual.
O Caramujo - a cabeça do homem.
Gafanhoto - desperdício e medo.

II – OBRAS:


“Vênus e Cupidos”, 1925.


Obra “mediterranista” onde já se encontram oniricamente vívidos os grandes espaços marinhos em que em muitas ocasiões usaria em seu posteriormente Surrealismo.


“Moça na janela”, 1925.



“A manequim”, 1926.



“O Grande Masturbador”, 1929.


Neste trabalho, Dali escandalizou até o mais aguerrido da época.
A porção central da pintura possui um perfil de cabeça humana olhando para baixo, a figura tem por base a formação rochosa em Creus, no litoral da Catalunha.
Uma figura feminina desnuda (que se assemelha à Gala Éluard, musa de Dali à época) surge na parte posterior da cabeça, o que pode significar a fantasia erótica sugerida pelo título da obra. A boca da figura feminina se encontra próxima ao saco escrotal de uma figura masculina pintada (da cintura para baixo) na parte superior esquerda da tela, o que sugere a possibilidade de sexo oral. Abaixo do perfil da cabeça, próximo à boca, há um grande gafanhoto, inseto temido pelo pintor.
A pintura representa as atitudes conflituosas do pintor em relação ao ato sexual. Foi pintada no contexto do seu encontro com Gala Éluard, então esposa de Paul Éluard, e que se tornaria, posteriormente, sua amante, esposa e musa inspiradora.

“A persistência da memória”, 1931.



“… No dia em que decidi pintar os relógios, pintei-os moles. Isso aconteceu numa noite de fadiga. Tinha uma enxaqueca, uma dor que muito raramente me atingia. Tínhamos pensado ir ao cinema com alguns amigos, mas no último momento decidi ficar em casa. Gala sairia com eles e eu deitar-me-ia cedo. Tínhamos acabado o jantar com um excelente camembert e, logo que fiquei sozinho, coloquei os cotovelos na mesa, refletindo um momento nos problemas postos pelo «supermole» deste queijo fluído. Levantei-me e fui para o atelier para dar, como era hábito, uma última olhadela ao meu trabalho. O quadro que estava a pintar representava uma paisagem dos arredores de Port Lligat cujos rochedos pareciam iluminados por uma luz transparente do entardecer. No primeiro plano, tinha feito o esboço de uma oliveira cortada e sem folhas. Esta paisagem devia servir de tela de fundo a alguma ideia, mas qual? Precisava de uma imagem extraordinária e não a conseguia encontrar. Quando ia para apagar a luz e sair, “vi” literalmente a solução: dois relógios moles um dos quais pendurados tristemente no ramo da oliveira. Apesar da enxaqueca, preparei a paleta e lancei mãos à obra. Passadas duas horas, quando Gala regressou do cinema, o quadro, que se tornaria um dos mais famosos, estava acabado…”

Às vezes chamada de "Relógios fundidos", o trabalho apresenta a interpretação geral do trabalho simbolizado pelo relógio que é, incansavelmente, o pressuposto de que o tempo é rígido ou determinista. Em primeiro plano apresenta algo como um caracol ou uma oliveira seca, sem folhas e três relógios marcando diferentes horários retratando a efemeridade da vida e a transitoriedade de todas as coisas. As imagens flácidas dos relógios que se dobram, mas não se desfazem, evocam a obsessão humana com a passagem do tempo e com a memória.
Embora metálicos, os relógios apresentam-se macios, flexíveis, maleáveis, parecendo fluir pela superfície onde estão localizados e, estão expostos e derretendo ao sol quente do Mediterrâneo, enquanto um quarto relógio permanece fechado e sendo devorado por insetos.
Distinguem-se pela cor, um pela cor vermelha, enquanto os outros três têm as cores dourado e prateado. Este plano encontra-se à sombra, os relógios desvanecem-se numa ligeira escuridão.
A luz solar encontra-se toda ela projetada no segundo plano, onde observamos os “rochedos do Cabo Creus”, dando assim um grande equilíbrio no quadro; neste plano mais iluminado predominam os tons amarelos, castanhos e o azul do mar.
Os relógios a dilatarem-se, o caracol ou ave que se encontra no chão também a dissolver-se, o quarto relógio a ser devorado e a oliveira seca e sem folhas são premonições de morte. Podem revelar o inconsciente do pintor, podemos eventualmente concluir que este tem medo da morte.
Nesse quatro percebe-se o conflito psicológico que se desenvolve através de um interessante jogo de contrastes: rochas duras e relógios moles, luz e sombras, realidade e sonho, razão e absurdo.
Através da linguagem imaginária da memória e dos sonhos. Dali distorce a realidade, retira os objetos do seu contexto real, tentando libertar-se da racionalidade e ultrapassar os limites da matéria em busca do abstrato e do insólito. Também o espaço e o tempo se deformam e desvanecem, à medida que a mancha escura vai tomando conta do quadro, sob a poderosa força, obscura e ilógica, que brota das profundezas da alma humana. Neste quadro, Dali pintou uma bela metáfora da mente humana, onde fervilha a vida anterior e interior, onde o tempo é medido e sentido, onde a fantasia expulsa o fato e onde a memória persiste.
A imagem de relógios moles se repete em várias outras pinturas de Dalí, como em “A desintegração da persistência da memória” (1952-54) e “Raios cósmicos ressuscitando relógios moles” (1965). Esta fluidez ou maleabilidade dos relógios é relacionada à noção de dilatação do tempo da Teoria da Relatividade Restrita.
Pouco tempo depois, um negociante de arte americano, Julien Lévy, comprou os relógios moles, rebatizando-o por “Persistência da memória”.
Essa obra fez com que Dalí se tornasse conhecido nos Estados Unidos, originando assim a sua fortuna. Dali achava o quadro extraordinário, mas antipúblico e impróprio para venda. Porém, o futuro provar-lhe-ia o contrário, pois o quadro foi vendido e revendido até terminar, finalmente, no Museum of Modern Art, onde é, sem dúvida, o mais célebre.


“Paranóia”, 1935-36


“Girafa em chamas”, 1936-37.


“Metamorfose de Narciso”, 1937.


O mito grego de Narciso, o jovem belo que viu sua imagem refletida em uma fonte e se apaixonou por ela. Segundo uma das versões, incapaz de satisfazer seus desejos ele se transformou em árvore; em outra alternativa dramática, ele se inclinou para frente até abraçar a imagem, caiu de cabeça dentro d'água e se afogou. Depois os deuses o transformaram em flor, Dali mostra Narciso sentado à beira de um lago, olhando para baixo, enquanto, próximo, uma figura de pedra se decompondo se parece bastante com ele. No fundo, um grupo de figuras nuas faz poses, enquanto uma figura semelhante a um narciso aparece no horizonte.


“O Sono”, 1937.


Em “O Sono”, Dali recriou o tipo de cabeça grande e mole e o corpo inexistente que aparecia com tanta frequência nos seus quadros por volta de 1929. Neste caso, entretanto, o rosto não é um auto-retrato. Sono e sonhos são temas comuns aos surrealistas, uma vez que é dormindo e sonhando que temos o domínio do inconsciente. O homem adormecido de Dali está dormindo precariamente sobre muletas. Muletas sempre foram à marca registrada de Dali, sugerindo a fragilidade em que nossa realidade se apóia. Até o cachorro está sustentado por ela. Toda a luz desta obra mostra a ideia de fuga do mundo real.


“Espanha”, 1938.


Espanha, pátria de Dalí, devastada pela guerra, está representada por uma mulher cuja cabeça e dorso superior podem também ser percebidos como grupos de homens lutando; os lábios dela correspondem a túnica vermelha de uma dos combatentes, os seios, as cabeças de dois cavaleiros. Tanto o rosto, quanto os combatentes estão pintados no estilo de Leonardo da Vinci.



“Crianças Geopoliticas Assistindo ao Nascimento do Novo Homem”, 1943.


Após a segunda guerra mundial, imaginava-se que o mundo seria outro e que nasceria um novo homem dessa experiência traumática que é a guerra.
Mas a visão de Dalí não demonstra este otimismo. A criança que assiste ao nascimento está assustada e a mulher que aponta para o acontecimento, a saída do homem do ovo- mundo, que é ao mesmo tempo esquelética e musculosa. É uma atmosfera de ameaça e não de alegria. O ovo é o próprio mundo, com uma casca mole, onde os continentes são moles e estão derretendo: misteriosamente, a África ocidental deixou cair uma lágrima. Há uma gota de sangue escorrendo da abertura de onde sai o homem.


“Galarina”, 1944-45.


Leda atômica”, 1947- 49.


“A Madona de Port Lligat” (Primeira versão), 1949.


“A Desintegração da Persistência da Memória”, 1952.


Na reelaboração do seu famoso persistência da memória, Dalí usou o espírito da desintegração nuclear. Um quadro simboliza a persistência e o outro a desintegração. Tudo está fragmentado em blocos geométricos; a maior parte da cena está sob a água, que Dali transformou numa espécie de pele, dependurada num galho.


“Crucifixação”, 1954.


“A Última Ceia”, 1955.


Como os outros quadros de Dalí, “A última ceia” provoca amplas reações: alguns críticos a denunciaram como banal, enquanto outros acreditam que Dalí conseguiu dar mais vida à imagem da Santa Ceia.
Jesus e os doze apóstolos, com as cabeças baixas, ajoelham em torno de uma grande mesa de pedra, suas formas sólidas constrastam com a transparência de Cristo. Dalí construiu este quadro baseando-se nos estudos de Leonardo da Vinci, que pintou a mais famosa das Santas Ceias.



“Rosa Meditativa”, 1958.


“A descoberta da América por Cristóvão Colombo”, 1958-59.



“A cara” (esboço para o "Toureador alucinógeno"), 1968-70.



“Gala do Cristo”, 1978.


ESCULTURAS:

Dois dos mais populares objetos do surrealismo foram os “Telefone Lagosta” e o “Sofá-lábios de Mae West”, completados por Dalí em 1936 e 1937, respectivamente. O artista surrealista e patrono Edward James encomendou esses dois tipos de peças de Dalí; James herdou aos cinco anos um grande número de imóveis em West Dean, West Sussex, e foi um dos principais apoiantes dos surrealistas na década de 1930.
"Lagostas e telefones tiveram forte conotação sexual para [Dalí] ", de acordo com a exibição da legenda para o "Telefone-lagosta", a que ele chamou de estreita analogia entre alimentos e sexo". O telefone foi funcionais, e James comprou quatro, um deles de Dalí para substituir os telefones em seu retiro casa.


“Telefone-lagosta”, 1938.


Sofá-lábios de Mae West foram moldada após Dalí observar os lábios da atriz Mae West, a que achou fascinante. West foi anteriormente objeto de Dalí em 1935 para pintura o rosto de Mae West.





“Rinoceronte vestido con puntillas”, de 1956, pesa 3.600 quilos.


TEATRO:

No teatro, Dalí é lembrado para a construção do cenário da peça de 1927 Mariana Pineda, de García Lorca . Para Bacchanale (1939), baseado em um balé e definido com uma música de Richard Wagner, de 1845 da ópera Tannhäuser, Dalí forneceu tanto o conjunto de design quanto o libretto.

CINEMA:

Dalí também participou da produção de filmes, mais notavelmente pela do filme “Um cão andaluz”, um filme francês de 17 minutos co-escrito com Luis Buñuel, que é amplamente lembrado por seus gráficos cena simulando a abertura de um globo ocular com uma navalha. Dalí colaborou novamente com Luis Buñuel em 1930 no filme, “l'âge d'Or”, e passou a escrever uma série de roteiros, muito poucos dos quais foram concebidos. Os mais conhecidos projetos de seu filme é provavelmente o sonho na sequência de Spellbound, de Alfred Hitchcock, que lembra fortemente em temas de psicanálise. Ele também trabalhou com uma produção Disney, na animação Destino; concluída em 2003 por Baker Bloodworth e Roy Disney, que contém imagens de sonho - como estranhas figuras e andar a pé pelo ar. Dalí completou apenas um outro filme em sua vida: Impressões de Alta Mongólia (1975), na qual ele narrou uma história sobre uma expedição em busca de gigantes cogumelos alucinogéneos. As imagens microscópicas foram baseadas em ácido úrico, manchas bronze sobre a banda de uma caneta esferográfica, sobre a qual Dalí teria urinado durante várias semanas.
Dalí construído um repertório em indústrias da moda e da fotografia. Na moda, a sua cooperação com a estilista italiana Elsa Schiaparelli é bem conhecida, onde Dalí foi contratado pela Schiaparelli para produzir um vestido branco. Outros desenhos Dalí fez a sua incluir um sapato em forma de chapéu e uma rosa para um cinto com fivela no formato de lábios. Também participou na criação de desenhos têxteis e de frascos para perfumes. Com Christian Dior, em 1950, Dalí cria a peça "fantasia para o ano 2045. Fotógrafos com quem colaborou incluem Man Ray, Brassaï, Cecil Beaton, e Philippe Halsman.
O filme Little Ashes, que foi lançado em 2009, é baseado na sua vida e obra. Robert Pattinson interpreta o papel de Dali. Com direção de Paul Morrison, ainda não tem previsão de estreia para o Brasil e Portugal.

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