quinta-feira, 21 de outubro de 2010

PICASSO (1881-1973)


“Deus é, sobretudo, um artista. Ele inventou a girafa, o elefante, a formiga. Na verdade, Ele nunca procurou seguir um estilo – simplesmente foi fazendo tudo aquilo que tinha vontade de fazer”.


“a arte é uma mentira que nos faz perceber a verdade.”

Nasceu em Málaga (Andaluzia) e recebeu o nome completo de Pablo Diego José Francisco de Paula Juan Nepomuceno María de los Remedios Cipriano de la Santíssima Trinidad Ruiz Picasso, filho de María Picasso y López e José Ruiz Blasco.
Em torno do seu nascimento surgiram várias lendas, algumas das quais Picasso se esforçou a promover. Segundo uma delas, Picasso nasceu morto e a parteira dedicou a sua atenção à mãe acamada. Só o médico, Don Salvador, o salvou de uma morte por asfixia soprando-lhe fumo de um charuto na face. O fumo fez com que Picasso começasse a chorar. O seu nascimento no dia 25 de outubro de 1881, às onze e um quatro da noite, seria assim descrito por Picasso aos seus biógrafos, que a publicavam de boa vontade.
Roland Penrose, um dos mais conhecidos biógrafos de Picasso, procurou nas suas origens a razão da sua genialidade e da sua abertura à arte, algo natural na compreensão de um gênio. Na geração dos seus pais são vários os vestígios. O seu pai era pintor e desenhista, de bem medíocre talento. Don José, dedicava-se a pintar os pombos que pousavam nos plátanos da Plaza de la Merced, perto da sua casa. Ocasionalmente, pedia ao filho para lhe acabar os quadros. A linhagem paterna possibilitou-se estudar até ao ano de 1841. Da descendência materna pesquisada, Dona María contava entre os antepassados com dois pintores. As feições de Picasso são também semelhantes às da mãe.
Os primeiros dez anos de vida de Pablo são passados em Málaga. O salário pequeno do pai como conservador de museu e professor de desenho na Escuela de San Telmo, a custo assegurava o sustento da família. Quando lhe ofereceram uma colocação com melhor remuneração no Instituto Eusébio da Guarda no norte do país, à hesitação sobrepôs-se a necessidade, e junto com a família, don José parte para a Corunha, capital de província à beira do Oceano Atlântico.
Os desenhos de infância de Picasso representavam cenas de touradas. Sua primeira obra, preservada, era um óleo sobre madeira, pintada aos oito anos, é chamada O Toureiro. Picasso conservou esse trabalho toda a sua vida, levando-o consigo sempre que mudava de casa. Anos mais tarde pintou outro quadro semelhante, A morte da mulher destacada e fútil. Picasso está zangado e rebelde. Este quadro é claramente uma expressão injuriosa da sua relação com a mulher.
A preocupação principal do pai com o pequeno Pablo era o seu aproveitamento escolar, mas nem por isso dispensou a oportunidade de fomentar o talento do filho. Desenhar foi desde cedo a forma mais adequada de Picasso se exprimir e, talvez por isso, secundário.
Recusa claramente o ensino usual, e encarrega-se ele próprio da sua formação artística. Com treze anos, e seguindo o modelo do pai, Picasso atingira já a perícia do progenitor (que também não era de grande refinamento). Ao contrário do que apontam algumas listas, Picasso era destro, como se pode ver no célebre documentário The Mystery of Picasso.
A família transferiu-se novamente, desta vez a Barcelona, na Primavera de 1895, e a prova de admissão na escola de arte La Lonja é feita com sucesso. Os trabalhos que deveria apresentar ao fim do mês, Pablo apresentava-os ao fim de poucos dias, ao cabo que o seu trabalho se destacava, inclusive, do dos finalistas. Com quatorze anos, Picasso conseguia superar as exigências de uma conceituada academia de arte. Trabalhos acadêmicos, que segundo o próprio, ao cabo de vários anos o assustavam. Os trabalhos que fazia colocavam-no na série de conceituados pintores de Barcelona, como Santiago Rusiñol e Isidro Nonell, e o seu quadro A Primeira Comunhão é exposto na célebre exposição da época na cidade. Apesar de ter optado por uma temática religiosa, este não deixa de ser um acontecimento privado, do plano familiar. Apesar de realista e de satisfazer as exigências acadêmicas, por outro lado a obra acaba por ser uma tentativa de combate ao convencionalismo.
Depois de uma estadia em Málaga, em 1897 instala-se em Madrid.
Em Madrid, instalado num novo atelier, inscreve-se na mais próspera e conceituada academia de artes espanhola, a Real Academia de Belas-Artes de São Fernando. Constantemente, visita o Museu do Prado, onde copiava os grandes mestres, captava-lhes o estilo e tentava imitá-lo, o que se revelou, por um lado, um avanço, pois desenvolvia capacidade efêmeras, e por outro lado, uma estagnação de um gênio criativo limitado à cópia do trabalho dos históricos, cujas obras também vieram a ser alvo de uma revisitação e reinterpretação de Picasso em fases mais avançadas.
Porém, a sua estadia em Madrid é interrompida. No início de Julho daquele ano, Picasso adoece com escarlatina e a recuperação obriga-o a retornar a Barcelona, recolhendo-se logo a seguir com Manuel Pallarés, seu amigo, para a aldeia Horta de Ebro nos Pirinéus. O recolhimento ajudou-o a restabelecer novos e ambiciosos projetos que levou a cabo assim que regressou a Barcelona. Afastara-se da academia e do lar paterno, e procurava abrir-se às inovações da arte espanhola, mantendo-se em contato com os seus representantes mais célebres. O espaço de culta da vanguarda espanhola era o café Els Quatr Gats. Ali conheceu os modernistas e rivalizou com a arte destes, influenciada pela Arte Nova francesa e pelas vanguardas britâncias.
Em 1900, nas instalações do mesmo estabelecimento, abre ao público a sua primeira exposição. Entretanto, o desejo de conhecer Paris aumentava ainda mais.



Após iniciar como estudante de arte em Madrid, Picasso fez sua primeira viagem a Paris (1900), a capital artística da Europa. Foi um período de extrema pobreza, frio e desespero. Muitos de seus desenhos tiveram que ser utilizados como material combustível para o aquecimento do quarto.


FASES DE PICASSO:

Na FASE AZUL (1901 a 1905), Picasso pintou a solidão, a morte e o abandono.


“Arlequim sentado”, 1901.


Família de Saltimbancos
Pablo Picasso, 1905
National Gallery of Art
Washington, Estados Unidos


“La vie”,1903. O óleo sobre tela está no Museu de Arte de Cleveland – Estados Unidos.

A obra é considerada parte do Período Azul. O homem retratado na pintura trata-se de Carlos Casagemas, amigo do artista, que se suicidou em 1901. Sua morte é retratada em diversas obras do artista, como em “La mort de Casagemas” (A morte de Casagemas) de 1901 – óleo sobre madeira que está no Museu Picasso, em Paris.
Repleto de simbolismos, este quadro foi interpretado como uma alegria do amor sagrado e do amor profano (a tela confronta um jovem casal seminu e a uma mãe vestida com um bebê em seus braços), do ciclo da vida e da carreira do pintor moderno. Talvez mescle tudo isso, e o dedo o rapaz, como nas imagens de São João Batista, indique a mudança que será registrada na trajetória artística de Picasso.


TRANSIÇÃO DA FASE AZUL PARA A ROSA:


Quando se apaixonou por Fernande Olivier, suas pinturas mudaram de AZUL PARA A ROSA (1905-1906). Trabalhava durante a noite até o amanhecer. Em Paris, Picasso conheceu um seleto grupo de amigos célebres nos bairros de Montmartre e Montparnasse: André Breton, Guillaume Apollinaire e a escritora Gertrude Stein.


“Nu sentado” é uma das pinturas de Pablo Picasso que marca o fim da Fase Azul que durou quase três anos e o início da Fase Rosa que durou de 1905 até 1906. A menos rígida, maior agilidade nas linhas e sutis deformações, nova beleza, terna e delicada, caracterizavam os quadros dessa época, onde o volume corpóreo das figuras ganha maior importância. Em “Nu sentado”, o olhar do modelo continua tristonho (marca da Fase Azul) enquanto o corpo já flutua num suave campo alaranjado...

FASE ROSA:

Na FASE ROSA há abundância de tons de rosa e vermelho, caracterizada pela presença de acrobatas, dançarinos, arlequins, artistas de circo, o mundo do circo.


“Arlequim com copo na mão”, 1905.


“Nu em pé”, 1907

No século 19, os artistas que seguiam os cânones do Romantismo não eram valorizados, eram desrespeitados e não conseguiam sair do ostracismo. Eram até considerados mártires do refinamento, como se fossem uns atrasados que não quisessem andar com os tempos. Picasso voltava sempre a esse tema em sua Fase Rosa. Os contemporâneos do pintor espanhol se referiam a esse período como o Período Arlequim de Picasso.
O artista de circo simbolizava o artista em geral, e sua vida sofrida em particular, e esses artistas, escarnecidos e marginalizados, ao entrar no picadeiro, interpretavam com orgulho, punham a alma na dedicação à sua arte. E Picasso valorizava isso e fez dos artistas circenses o motivo mais presente em seus primeiros anos parisienses.
Para os adeptos do Romantismo, como Picasso, não havia diferença fundamental entre um artista de circo e um artista de teatro, ambos passavam pelo mesmo martírio artístico. O fato é que essa ligação afetiva entre os românticos e os artistas de circo acabou sendo a primeira oportunidade comercial real para Pablo Picasso. Um galerista, palhaço aposentado, chamado Clovis Savigot, resolveu expor os quadros do pintor que tanto defendia e retratava os personagens do circo. E foi através da galeria de Savigot que Picasso conheceu Gertrude Stein e seu irmão Leo, que se tornariam importantes colecionadores de Arte Moderna, incentivadores dos pintores e poetas e grandes amigos de Picasso.
A imagem de hoje é duplamente interessante. O arlequim com copo na mão está num dos cafés mais célebres de Paris – o “Lapin Agile”, fundado em meados do século 19. Por sua localização, pleno Montmartre, e por ser bem popular, o "Lapin Agile" era ponto de encontro de pintores, escritores e poetas no início de suas carreiras (o café ainda está lá...). Mas o mais interessante é que o arlequim retratado é ninguém menos que o próprio Picasso, com a roupa que passou a significar tanto para ele e sua carreira.
No verão de 1906, durante uma estada em Andorra, sua obra entrou em uma nova fase marcada pela influência das artes gregas, ibérica e africana, era o protocubismo, o antecedente do cubismo. O célebre retrato de “Gertrude Stein” (1905-1906) revela um tratamento do rosto em forma de máscara.


“Gertrude Stein” (1905-1906)


“Auto-Retrato” (1907)

Utilizando-se de poucos traços; linhas retas; sugerindo rapidez, o artista apresenta seu auto-retrato de maneira tosca, rústica, nariz achatado, olhos grandes, remetendo-nos à origem africana.


As senhoristas de Avinhão, (1907), Pablo Picasso

“Les demoiselles d’Avignon” (As senhoritas de Avinhão) é um dos mais famosos quadros do pintor espanhol Pablo Picasso. Pintado em 1907, óleo sobre tela, este quadro encontra-se exposto no MoMA – Museu de Arte Moderna de Nova Iorque (www.moma.org), nos Estados Unidos. É um quadro pré-cubista, que evidência o impacto da arte africana.
Seu trabalho mais revolucionário.
Considerada a primeira obra cubista, em sua fase azul.
Na época em que pintou, Picasso tinha completa noção que este era o quadro mais importante que havia pintado até então. Para a obra definitiva, Picasso passou meses a fazer esboços e, durante o trabalho, fez inúmeras modificações. Quando concluiu a obra, havia concebido a maior tela que alguma vez pintou.
Esta obra representa, para além de uma obra-prima do cubismo mundial, a violação de todas as tradições e convenções visuais naturalistas ocidentais, ao apresentar cinco aleivosas (prostitutas), representadas de forma cubista, como se nota na mulher nua sentada à direita, vista simultaneamente de frente e de costas. Os rostos das personagens refletem o início do Período Negro, na obra de Picasso, assemelhando-se a máscaras e esculturas africanas. A estética geométrica e visual delimitou contornos quanto ao futuro do cubismo.
Retrata cinco mulheres (senhoritas prostitutas) de um bordel francês, Avinhão (cidade dos papas) de formas geometrizadas e deformadas. Os rostos das figuras em poses sensuais clássicas, com exceção à sentada com pernas abertas, fazem referências à pintura acadêmica, braços levantados realçando as formas do busto; contendo duas mulheres centrais com expressões de andaluzas (sul da Espanha, terra natal do pintor) e três com feições que lembram máscaras africanas. Releva-se que a partes “realmente” cubista do quadro são os dois nus femininos da metade à direita, que contrastam com os que se situam na metade à esquerda, além da mulher sentada à direita, possibilitando seu corpo ser visto de costas, mas seu rosto de frente.
Suas mulheres nuas e esquálidas possuem olhos enormes e com olheiras sob o espanto da degradação.
Ao repararmos na moça da esquerda, não podemos distinguir se há uma porta atrás e, no centro podemos observar algumas frutas.
As figuras são planas e o cenário avança em nossa direção (inversão dos volumes).
Os traços brancos e azuis dão corporiedade à obra.
De formato inusitado, quase quadrado (243,9 X 233,7 cm) e de tema provocativo, faz referência à arte africana (máscaras negras), à escultura ibérica com suas violentas transformações do rosto (Picasso possuía duas estatuetas dessas em seu ateliê) e à oriental.
Cézanne denominaria esse quadro por “O Banho de Diana” ou “Vênus” se tivesse sido pintado no século XVIII, como forma de justificar o nu artístico.
A obra marca na carreira do artista a transição para o cubismo. O nome desse quadro, o mais famosos de Picasso juntamente com “Guernica”, não foi dado por seu autor, foi batizado mais tarde pelo escritor francês André Salmon, amigo de Picasso, numa alusão maliciosa a uma rua mal-afamada de Barcelona, rua de Avinyó.
O quadro inaugura uma visão pictórica radicalmente nova: a decomposição das formas; sua reorganização no plano; as imagens que abandonam a semelhança realista para se tornarem símbolos e a destruição da velha imagem do homem, herdada de séculos de civilização, para tentar construir a nova face da modernidade.
Toda a ilusão de profundidade foi eliminada e os elementos de cena são trazidos para frente, como que empilhados.


“O retrato de Ambroise Vollard” (1910)

“Não sei se sou um grande pintor”, disse Picasso, “mas sou um grande rascunhador”. Embora soubesse captar a semelhança com tanta perfeição quanto Ingres, ele preferiu inventar novas formas a perpetuar as antigas.
No quadro cubista analítico de Vollard, Picasso quebra o modelo numa estrutura cristalina de facetas interligadas em tonalidades baixas.
Foi marchand de Picasso e Cézanne. Trata-se de uma pintura quadrimensional (espaço e tempo).


COLAGEM:

Em 1912, Picasso realizou sua primeira colagem, colou nas telas pedaços de jornais, papéis, tecidos, embalagens de cigarros.


“Copo e Garrafa de Suze” (Paris, 1912)


“Mesa com Garrafa,
Copo de Vinho e Jornal” (Paris, 1912)


“Natureza morta” (1912)

Madeira, fragmentos da realidade (acrescentar pedaços da própria realidade) e técnica da colagem.


CUBISMO SINTÉTICO:


Em seus trabalhos do Cubismo Sintético, PICASSO abandonou os aspectos picturais e ilusionistas do Cubismo Analítico e tratou a tela ou painel em que trabalhava como uma base sobre a qual construía imagens. Usou frequentemente fragmentos de papel e outros materiais que envolviam certo grau de projeção, a partir dessa base.
Um prolongamento lógico de tal processo foi o relevo construído. PICASSO produziu uma série desses relevos em 1913-14, que inspiraram o desenvolvimento da escultura construtivista na Rússia.


“Ma Jolie” (1914)

No plano privado, 1911 é o ano do rompimento com Fernande Olivier e da entrada na vida de Picasso de Eva Gouel, que aparecerá em sua obra sob o nome de Ma Jolie [Minha formosa]. "Houve uma época em sua vida, de 1912 a 1914, na qual era impossível, dado o que ele ambicionava, fazer um retrato. Mas mesmo nessa época Picasso quis manifestar seu amor nos quadros. Tenho uma carta em que ele diz mais ou menos o seguinte: 'Eu amo Eva... e escreverei isso em meus quadros”. De fato, há quadros dessa época em que ele escreveu, sobre um pão de mel pintado em forma de coração, “Eu amo Eva”... Há outros quadros da mesma época em que aparece Ma Jolie. Ma Jolie era o nome de uma canção que ouvíamos nas boates de Montmartre quando ele cortejava Eva. Era também a ela que se referia quando colocava Ma Jolie nas pinturas."
Eva inspira-lhe também uma de suas mais belas obras cubistas, Femme en chemise dans un fauteuil [Mulher de camisola numa poltrona] (1913, coleção particular). Sua morte prematura em 1915, quando o casal vivia um amor tranquilo, deixa-o totalmente arrasado.

Em seguida, Picasso apaixonou-se por Olga Koklova, uma bailarina. Casaram-se em 12 de julho de 1918. Neste período o artista já se tornara conhecido e era um artista da sociedade. Quando Olga engravidou, criou uma série de pinturas de mães com filhos.


“Cabeça de mulher”, 1922.


“Bandolim, Fruteira e Braço de Gesso”, 1925.


“O estúdio” (1928-29)

Grande exemplo do Cubismo Sintético. Emprega cores fortes e formas decorativas. À esquerda, o pintor segura um pincel, indicado por uma pequena linha diagonal no final de um “braço” horizontal. A “cabeça” oval contém três olhos verticais, sugerindo talvez a visão superior do pintor. Um círculo flutuante é só o que resta da paleta do artista.
“Foto como elemento da composição. Como posso analisar, posso sintetizar..”



“A Sonhadora”, 1932.


“Guernica” (1937)

“O que vocês pensam que seja um artista? Um imbecil feito só de olhos, se é pintor, ou de ouvidos, se é músico, ou de coração em forma de lira, se é poeta, ou mesmo feito só de músculos, se trata de um pugilista? Muito ao contrário, ele é ao mesmo tempo um ser político, sempre alerta aos acontecimentos tristes, alegres, violentos, aos quais reage de todas as maneiras. Não; a pintura não é feita para decorar apartamentos. É um instrumento de guerra para operações de defesa e ataque contra o inimigo”.

GUERNICA cumpre dois papéis: de representar um acontecimento histórico e o de ser um acontecimento histórico (intervenção da cultura na luta política).
Nesse enorme quadro (3,50 m X 7,82 m) Picasso utilizou apenas o preto, o branco e alguns tons de cinza, criando detalhes que impressionam o observador e para enfatizar o desespero.
Nesta obra é nítida a indignação do artista frente ao bombardeio da cidade espanhola de Guernica por aviões alemães sobre a capital basca de mesmo nome, responsáveis pela morte de grande parte da população civil, durante a Guerra Espanhola.
A obra mostra sua visão particular da angústia do ataque, com a sobreposição, a fragmentação de figuras e a distorção para transmitir a violência.
As linhas quebradas e os planos fragmentados do Cubismo denotam terror e confusão, enquanto o formato em pirâmide segura, a unidade da composição.
O que mais se destaca no quadro é o seu pensamento sintético, a falta de uma narrativa, a ausência de cores ou de relevos, características primordiais com as quais percebemos a natureza. Não perceber a natureza é cortar as relações que se tem com ela e com a vida. Com isso só resta à morte.
Outra característica da obra é uma crise na forma, que é a representação máxima de uma civilização. A forma que reconhecemos e admiramos é produto da cultura de nossa civilização; quando esta entra em crise, representa uma crise na própria civilização.
Estas características mostram como o autor entende a sociedade em que vive e suas transformações em seus aspectos mais gerais.
O painel encontra-se dominado no alto pela luz de um olho-lâmpada - símbolo da mortífera tecnologia - seguida de duas figuras de animais. No centro um cavalo morrendo com o corpo contorcido parecendo relinchar, em disparada, representa as forças irracionais da destruição. A direita dele, impassível, um perfil picassiano de um touro imóvel. Talvez seja símbolo da Espanha em guerra civil, impotente perante a destruição que a envolvia. Logo abaixo do touro, encontramos uma mãe com o filho morto no colo. Ela olha para cima como quem procurando identificar de onde vêm as bombas e clamando aos céus por uma intervenção. Trata-se da moderna Pietá de Picasso. Uma figura masculina, geometricamente esquartejada, domina as partes inferiores. À direita, uma mulher grávida com seios expostos voltada para a luz, implora pela vida, enquanto outra, incinerada, ergue inutilmente os braços para o vazio, enquanto uma casa arde em chamas. Naquele caos a tecnologia aparece esmagando a vida.
Não vemos as bombas; apenas um clarão ao fundo. Mas reconhecemos a violência da cena: um bombardeio sobre uma cidade desprotegida.
Alguns símbolos de Picasso, como o guerreiro morto com a espada quebrada, implicando derrota, não são difíceis de decifrar. A única explicação de Picasso para outros símbolos era: “O touro não é o fascismo, mas a brutalidade e a escuridão...O cavalo representa o povo”.

Guernica, em 26 de abril de 1927, tinha sido severamente bombardeada por aviões alemães, postos à disposição de Franco, ditador líder do governo espanhol, aliado de Hitler. Dos sete mil habitantes da cidade, 1.654 morreram e 889 ficaram feridos.
O massacre teve como objetivos a submissão do Pis Basco e a demonstração da nova técnica bélica alemã, o bombardeamento de saturação, que seria depois usado em larga escala na Segunda Guerra Mundial. Este consistia em usar técnicas modernas e científicas para maximizar os danos e o número de vítimas nos bombardeios e para facilitar o avanço das unidades de infantaria.
Os motivos do bombardeio eram claros: serviriam de exemplo para os bascos e para todos aqueles que se opusessem aos alemães e a seus aliados.
Picasso assume uma posição ofensiva. Por meio da pintura, não pretende apenas mostrar os horrores da guerra, mas, com uma nova estética, obrigar a humanidade a sentir-se co-responsável, se não por participação direta ou por submissão pela carnificina realizada contra o povo basco.
Foi uma das grandes premonições histórico-estéticas do século. Dois anos depois teria o início o martírio das populações de Varsóvia, de Londres, de Berlim, de Hamburgo, de Leningrado, de Dresden, de Hiroxima e de Nagasaki, que padeceriam, devido aos bombardeamentos em massa, dos mesmos tormentos das imagens dilaceradas do quadro de Picasso. Exatamente por não ter nenhum signo específico de agressão, nenhuma suástica ou distintivo franquista ou falangista, a composição transcendeu os acontecimentos da infausta Guerra Civil espanhola tornando-se um manifesto estético dos horrores provocados por uma tecnologia a serviço da desumanização. Picasso pintou a obra-prima do século, onde se misturam as contradições da nossa época: progresso e violência, catástrofe e prosperidade.

Um pouco da história...

Era uma 2ª feira, dia de feira-livre na pequena cidade da Biscaia. Das redondezas chegavam as suas estreitas ruas os camponeses do vale de Guernica, no país dos bascos, trazendo seus produtos para o grande encontro semanal. A praça ainda estava bem movimentada quando, antes das cinco da tarde, os sinos começaram os seus badalos. Tratava-se de mais uma incursão aérea. Até aquele dia fatídico - 26 de abril de 1937 - Guernica só havia visto os aviões nazistas da Legião Condor passarem sobre ela em direção a alvos mais importantes, situados mais além, em Bilbao. Mas aquela 2ª feira foi diferente. A primeira leva de Heinkels-11 despejou suas bombas sobre a cidadezinha precisamente às 16:45 horas. Durante as 2 horas e 45 minutos seguintes os moradores viram o inferno desabar sobre eles. Estonteados e desesperados saíram para aos arredores do lugarejo onde mortíferas rajadas de metralhadora disparada pelos caças os mataram aos magotes. No fim da jornada contaram-se 1.654 mortos e 889 feridos, numa população não superior a 7 mil habitantes. Quase 40% haviam sido mortos ou atingidos. A repercussão negativa foi tão grande que os nacionalistas espanhóis trataram logo de atribuí-la aos "vermelhos".
A escolha da pequena Guernica deveu-se a vários motivos. A cidade era um alvo fácil, sem proteção antiaérea, além de não ter uma população numerosa. Além disso, abrigava um velho carvalho (Guernikako arbola) embaixo do qual os monarcas espanhóis ou seus legados, desde os tempos medievais, juravam respeitar as leis e costumes dos bascos, bem como as decisões da batzarraks (o conselho basco). Como o levante de Franco foi também contra a autonomia regional, a destruição de Guernica serviria como uma lição a todos os que imaginavam uma Espanha federalista ou descentralizada. Assim, quando a notícia da dizimação provocada pelo bombardeamento "científico" chegou aos jornais provocou um frêmito de horror em todos os cantos do mundo. Quase todos os habitantes de cidades, em qualquer lugar do planeta, sentiram instintivamente que estavam sendo apresentados a outro tipo de guerra, à guerra total, e que, doravante, por vezes, seria mais seguro estar-se numa trincheira no fronte, do que vivendo numa grande capital.


Mulher chorando com lenço (1937)

Na tela “Mulher chorando com lenço”, também de 1937, Picasso retoma parte dos esboços feitos para Guernica, ampliando os traços (feitos à margem inferior esquerda) de uma mãe que carrega seu filho morto nos braços. Envolta em luto e dor, a mulher agora está sozinha.
O rosto fragmentado, distorcido e atormentado é realçado pelas cores berrantes. “As cores estão para um pintor assim como os conceitos estão para os filósofos“, diria Guilles Deleuze.
Curioso (se olharmos mais atentamente) é que os dedos da mulher tornam-se o próprio lenço, sendo mordido desesperadamente pela mãe, numa simbiose que representa (segundo uma das interpretações possíveis) a tristeza, a dor da perda de um ente querido em um mundo atroz e cruel.


“Dora Maar no braço da cadeira”, 1939.

Entre o começo e o fim da 2ª Guerra Mundial (1939-1945), dedica-se também à escultura, gravação e cerâmica. Como gravador, domina as diversas técnicas: água-forte, água-tinta, ponta-seca, litogravura e gravura sobre linóleo colorido. Além disso, sua dedicação à arte escultórica era esporádica. Cabeça de Búfalo, Metamorfose é um grande exemplo de seu trabalho com esse meio. É considerado um dos pioneiros em realizar esculturas a partir de junção de diferentes materiais.


Mulher no jardim”, 1932.

Em 1943, Picasso conhece a pintora Françoise Gilot e tem dois filhos, Claude e Paloma e encontrou um pouco de paz e pintou “Alegria de Viver”.
Em 1968, aos 87 anos, produziu em sete meses uma série de 347 gravuras recuperando os temas da juventude: o circo, as touradas, o teatro, as situações eróticas. Anos mais tarde, uma operação da próstata e da vesícula, além da visão deficiente, põe fim às suas atividades. Como uma honra especial a ele, no seu 90ª aniversário, são comemorados com exposição na grande galeria do Museu do Louvre. Torna-se assim o primeiro artista vivo a expor os seus trabalhos no famoso museu francês.



Pablo Picasso morreu a 8 de abril de 1973 em Mougins, França com 91 anos de idade. Diz-se que levou toda a sua vida a saber pintar como uma criança.

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