terça-feira, 24 de janeiro de 2012

A LITERATURA NO VESTIBULAR: UNICAMP E FUVEST 2013/2014/2015

Como dar conta dos nove livros de leitura obrigatória exigidos para os próximos vestibulares da FUVEST e da UNICAMP?
Como formar leitores de textos literários e não literários, identificar, analisar e interpretar as nove obras selecionadas, em seus contextos histórico-culturais; sua arquitetura; sua organização e em suas especificidades enquanto obras de arte, dialogando, como ferramenta para a construção de conhecimentos nas mais diferentes áreas e disciplinas?
Essas questões angustiam os estudantes que vão enfrentar as provas de literatura das referidas universidades.  
O blog TRAVESSIA POÉTICA não pretende substituir a leitura integral das nove obras da lista unificada da FUVEST e UNICAMP.  Seu escopo principal é proporcionar aos vestibulandos uma contextualização das obras e seus referidos autores, situando-os no tempo e no espaço, facilitando-lhes a identificação da estética a que pertencem.  Pretende ainda apresentar uma orientação que facilite a leitura e a compreensão dos textos, tanto pela inclusão de notas, comentários, glossário, análise crítica literária quanto pelo direcionamento do olhar e da atenção para que possam superar algumas dificuldades específicas de certas obras. Além de provocar a fixação de tudo o que é necessário para que o vestibulando tenha condições de resolver com tranquilidade a prova de Literatura.

 LISTA DE LEITURA OBRIGATÓRIA DOS VESTIBULARES FUVEST/UNICAMP 2013/2014/2015:

ROMANTISMO EM PORTUGAL:
"Viagens na minha terra", Almeida Garrett

ROMANTISMO NO BRASIL:
"Til", José de Alencar
"Memórias de um sargento de milícias", Manuel Antônio de Almeida

REALISMO EM PORTUGAL:
"A cidade e as serras", Eça de Queirós

REALISMO NO BRASIL:
"Memórias póstumas de Brás Cubas", Machado de Assis

NATURALISMO NO BRASIL:
"O cortiço", Aluísio de Azevedo

MODERNISMO NO BRASIL/POESIA:
"Sentimento do mundo", Carlos Drummond de Andrade

MODERNISMO NO BRASIL/PROSA:
"Vidas Secas", Graciliano Ramos
"Capitães da areia", Jorge Amado

“VIAGENS NA MINHA TERRA”, ALMEIDA GARRETT

Segundo os críticos Antonio José Saraiva e Oscar Lopes, “neste livro – misto de diário, literatura de viagens, reportagem e ficção, o escritor português narra a história de um rapaz (Carlos) que se apaixona de um modo sucessivo e intenso por várias mulheres e se sente incapaz de estancar este constante fluir da vida amorosa, de fixar e estabilizar a sua personalidade afetiva. (...) Ninguém – continuam os críticos -, antes de Garrett, na ficção portuguesa, entrara tão sutilmente na análise do que há de convencional, fictício ou autêntico na vida sentimental, na confusão da verdade e da mentira, de vida atual e de sobrevivência que é o todo afetivo de cada indivíduo; e ninguém pôs em termos agudos o problema do desgarrar da personalidade na mudança de tudo, ligando-o, ao mesmo tempo, ao ceticismo superveniente a uma causa generosa que degenera: Carlos descrê de um amor verdadeiro, ao mesmo tempo que descrê da revolução...”
O romance “Viagens na minha terra” foi composto sob a forma de folhetim, bem ao gosto romântico da época. Sua narrativa, apesar de grande base descritiva, dos adjetivos em excesso, é saborosa, envolvente e apresenta temas essencialmente românticos como: natureza ativa e confessional; heroísmo; nacionalismo; lirismo amoroso e morte.
Há em Garrett um observador minucioso de fatos, excluindo-se o tom melodramático tornando-se um antecipador de Eça de Queirós. O autor usa um estilo extremamente vivo, com giros e expressões coloquiais – um estilo que se molda ao pensamento no seu fazer-se, apto a sugerir leves emoções, associações fugidias, estados de devaneio, os meandros duma nova sensibilidade.  
Nesse romance, Garrett não está concentrado em narrar uma história, mas, ao contrário, parece estar-se afastando da história, para contá-la, supõe-se, mais tarde. Esta técnica de suspensão da narrativa, em favor de comentários e opiniões variados, sob o ritmo da emoção crítica e da fineza intelectual, denomina-se digressão.
Desse modo, relata assuntos sobre economia, geografia, política, literatura, arquitetura, justiça, filosofia, religião, história ou costumes sociais, sem, no entanto, tirar a unidade do livro. Pois eles convergem para dois tipos de emoção alternantes: a da observação terna e enlevada, e a do ceticismo cultural, tratado geralmente com humor crítico. É com ternura que Garrett se lembra de algumas paisagens de sua terra, das velhas histórias ligadas ao folclore ou que ele nos fala de poetas prediletos, como Homero, Virgílio, Dante, Camões, Goethe e outros. Mas é com pessimismo político que ele vê as últimas gerações de portugueses, envolvidos pela mentalidade lucrativista.


“TIL”, JOSÉ DE ALENCAR

A obra Til” recebe da crítica a denominação de “romance social regionalista”.
A característica mais acentuada no romance é apresentar uma supervalorização do interior do país, no século XIX; a vida bucólica nas fazendas paulistas, na época do café e a descrição de costumes interioranos. No entanto, o mais precioso nessa obra é o poder de imaginação e a capacidade de construir narrativas bem estruturadas.
O espaço, embora ocupe lugar de destaque nesse romance alencariano, uma doce e leve narrativa tece regiamente a trama que envolve os inocentes e despreocupados personagens Berta, Miguel, Linda e Afonso, que são adolescentes e protagonistas de vários episódios sem grandes consequências.
As personagens são heróis regionais puros, sensíveis, honrados, corteses, muito parecidos com os heróis dos romances indianistas.  Mudavam as feições, mudava a roupagem, mudava o cenário. Mas, na criação de todas essas personagens, Alencar perseguia o mesmo objetivo: chegar a um perfil do homem essencialmente brasileiro.
As personagens são planas, excetuando-se Jão Fera, capanga profissional com desejo de vingança.


“MEMÓRIAS DE UM SARGENTO DE MILÍCIAS”, MANUEL ANTÔNIO DE ALMEIDA

Publicado anonimamente em folhetins semanais no jornal, Correio Mercantil do Rio de Janeiro, de 27 de junho de 1852 a 31 de julho de 1853, com a autoria atribuída a “um brasileiro”, ganhando logo depois, forma de livro em dois volumes: o primeiro, em 1853 e o segundo, em 1854. A nova edição passou praticamente despercebida, e a obra caiu no esquecimento por muitos decênios, até que a renovação modernista veio a fazer-lhe justiça.
A obra é composta de 48 capítulos (a novela está dividida em duas partes bem distintas: a primeira com 23 capítulos e a segunda com 25), a maioria deles muito curtos cujos títulos, também pequenos, resumem a ação ou o conflito principal narrado no capítulo. Os episódios são quase autônomos, só ligados pela presença de Leonardo, dando à obra uma estrutura mais de novela que de romance.
Segundo Eliane Zagury, tendo sido composta para ser lida de forma periódica, no folhetim, a narrativa, apresenta alguns traços técnicos típicos, derivados das narrativas medievais de leitura periódica coletiva, como os enredos paralelos e alternados, que ainda hoje são à base da telenovela. E, cada vez que o autor muda o foco da narrativa, faz uma chamada ao leitor, quase a lembrá-lo de que, apesar de tudo, aquele ainda é o mesmo folhetim.
Enquanto em Macedo desfilavam-se mocinhos e donzelas idealizadas pelos salões da corte e nos saraus, Manuel Antônio de Almeida contrasta com os romances românticos de sua época e possui traços que anunciam a literatura modernista do século XX, por várias razões. Primeiro, por ter como protagonista um herói malandro (Leonardo é o primeiro malandro da literatura brasileira), ou um “anti-herói”, caracterizado como vagabundo, mentiroso e que alcança seus ideais não pela hombridade, mas pelo “jeitinho” brasileiro do favoritismo, na opinião de alguns críticos. Segundo, pelo tipo especial de nacionalismo que o caracteriza ao documentar traços específicos da sociedade brasileira, em questão a do Rio de Janeiro, ainda antes da Independência, no tempo do rei D. João VI e a família real portuguesa no Brasil, fugindo de Napoleão,  com seus costumes, as festas populares, folclóricas e religiosas, dando um caráter documental da época, porém descritas com humor e sátiras, os comportamentos e os tipos sociais de um estrato médio da sociedade. Não há idealização das personagens, mas observação direta e objetiva. Presença de camadas inferiores da população (barbeiros, comadres, parteiras, meirinhos, "saloias", designados pela ocupação que exercem). As personagens não são heróis nem vilões (praticam o bem e o mal) impulsionadas pelas necessidades de sobrevivência (a fome, a ascensão social), até então ignorado pela literatura. Terceiro, pelo tom de crônica que dá leveza e aproxima da fala ao estilo jornalístico.
Há, por parte dos críticos literários de hoje, certa unanimidade em torno das Memórias, que aponta o seu caráter ímpar em relação aos demais livros pertencentes ao Romantismo brasileiro, o criador de Leonardo, andando aparentemente à margem da preocupação nacional, nos apresenta um livro que, à primeira vista, escapa da lógica romântica e pontua alguns problemas do país, colocando esse livro numa posição destoante em relação ao próprio Romantismo.
Antonio Candido no seu famoso estudo sobre as Memórias, em “Dialética da Malandragem”, afirma que o livro de Manuel Antônio de Almeida é talvez o único livro em nossa literatura do século XIX que não exprime uma visão de classe dominante. A obra retrata a luta de uma classe social que está em posição de intermediária: de um lado, ela se vê despida de qualquer poder de mando, atividade praticamente exclusiva à elite senhorial; e, de outro, se vê distante da noção de trabalho, já que o trabalho era “obrigação” do escravo.
Manuel Antônio de Almeida, escrevendo em meados do século, já no Segundo Império, olhava para o passado de sua cidade, no início do século, com o interesse intensificado pela distância, pois entre os dois momentos o Rio e seus habitantes tinham passado por transformações significativas.
O leitor acompanha o crescimento do herói com sua infância rica em travessuras, a adolescência com as primeiras ilusões amorosas e aventuras, e o adulto, que, com o senso de responsabilidade, que essa idade exige, vai-se enquadrando na sociedade, o que culmina com o casamento.


“A CIDADE E AS SERRAS”, EÇA DE QUEIRÓS

Publicado em 1901, no ano seguinte ao da morte de Eça de Queirós, o romance “A cidade e as serras, foi desenvolvido a partir da ideia central contida no conto Civilização, datado de 1892.
É um romance denso, ao longo do qual Eça de Queirós ironiza ferrenhamente os males da civilização, fazendo elogios aos valores da natureza. Nela o escritor relata a travessia de Jacinto de Tormes, um ferrenho adepto do progresso e da civilização - da cidade para as serras. Ele troca o mundo civilizado, repleto de comodidades provenientes do progresso tecnológico, pelo mundo natural, selvagem, primitivo e pouco confortável, no sentido dos bens que caracterizam a vida urbana moderna, mas onde encontra a felicidade, mudando radicalmente de opinião.
A obra preconiza uma relação entre as elites e as classes subalternas na qual aquelas promovessem estas socialmente, como faz Jacinto ao reformar sua propriedade no campo e melhorar as condições vida dos trabalhadores.
A cidade e as serras” é um romance composto por 16 capítulos que podem ser divididos em duas partes: a primeira parte é formada pelos capítulos de 1 a 7 e metade do oitavo (a cidade); e a segunda parte vai de metade do oitavo capítulo até o final do livro (as serras).
Narrado em primeira pessoa, como a maioria dos romances de Eça de Queirós, há um narrador-personagem, Zé Fernandes, o qual não se confunde com o protagonista da obra, Jacinto de Tormes.
É um narrador-testemunha, pois além de ser personagem da história, ele conta o que vê e sobre o que ficou sabendo e o que aconteceu.
“Segundo Norman Friedman, o narrador-testemunha narra em 1ª pessoa, mas é um “eu” já interno à narrativa, que vive os acontecimentos e, portanto, dá-los ao leitor de modo mais direto, mais verossímil.”
O importante é observar que tudo o que foi narrado, foi selecionado pela memória do eu-narrativo (Zé Fernandes) a partir da sua memória dos fatos e da sua subjetividade. Portanto, todas as personagens, as paisagens e os acontecimentos são apresentados com base nas opiniões desse narrador.
A questão espacial nessa narrativa é de suma importância. Na primeira parte da obra, nos é apresentada a grande Cidade - Paris (o boulevard; o Bosque de Bolonha; Montmartre; a Avenida dos Campos Elíseos) e a partir do Cap. VIII, o Baixo Douro, as Serras (Tormes).


“MEMÓRIAS PÓSTUMAS DE BRÁS CUBAS”, MACHADO DE ASSIS

“Memórias Póstumas de Brás Cubas” é um romance escrito  a princípio “aos pedaços”, como escreve o próprio Machado de Assis, desenvolvido em folhetim, de março a dezembro de 1880, Revista Brasileira, para, no ano seguinte, ser publicado como livro, pela então Tipografia Nacional.
De acordo com o próprio Machado, à época da 4ª edição do livro, o volume publicado não recebeu grandes modificações ou retificações. Os fragmentos publicados na Revista Brasileira foram corrigidos em vários lugares pelo autor. Quando teve que o rever para a terceira edição, "emendei alguma coisa e suprimi duas ou três dúzias de linhas. Assim composto, sai novamente à luz esta obra que alguma benevolência parece ter encontrado no público", escreveu ele. As modificações mais significativas que ocorreram da passagem de folhetim para livro publicado tenham sido somente a introdução de um preâmbulo, assinado por Brás Cubas e denominado "Ao Leitor", e substituição de uma epígrafe retirada de uma comédia de Shakespeare pela dedicatória ao “primeiro verme que roeu as frias carnes do meu cadáver”. Também acredita-se que o principal trabalho de revisão de Machado de Assis foi focar-se no início e no final do livro, as duas partes onde notam-se "recursos criativos destinados a abalar várias das convenções vigentes na prosa de ficção da época."
A estrutura de “Memórias Póstumas de Brás Cubas” tem uma lógica narrativa surpreendente e inovadora. A sequência do livro não é determinada pela cronologia dos fatos, mas pelo encadeamento das reflexões do personagem. É uma narrativa dialogicamente estruturada, em que o leitor é fundamental, pois há um intenso processo de comunicação com ele, como se ele desempenhasse um papel no texto. Assim, o autor compartilha com o leitor a tarefa de narrar.
Organizados em blocos curtos, os 160 capítulos de “Memórias Póstumas de Brás Cubas” fluem segundo o ritmo do pensamento do narrador. A aparente falta de coerência da narrativa, permeada por longas digressões, dissimula uma forte coerência interna, oferecendo ao leitor todas as informações para conhecer a visão de mundo de um homem que passou pela vida sem realização nenhuma, apenas ao sabor de seus desejos.
O narrador machadiano representa-se dramaticamente revestido de múltiplas máscaras,  simbolizando a manifestação do que é simultaneamente presente e ausente, apresentando as unidades duais que permeiam o drama universal. Nas “Memórias Póstumas”, a morte acossa a vida durante toda a narrativa. O próprio escritor surge no ato da morte: se Brás Cubas não tivesse morrido, o "defunto autor" não existiria e, consequentemente, não haveria estas “Memórias”.
Machado de Assis escolheu a situação fantástica e autobiográfica de Brás Cubas, um narrador-personagem (1º pessoa) que, depois de morto, conta sua vida e assume uma posição transtemporal, de quem vê a própria existência já de fora dela, “desse outro lado do mistério”, de modo onisciente, descontínuo e sem a pressa dos vivos. O narrador  procura mais "parecer" do que "ser", isto é, dá-nos a impressão que se trata de um relato caracterizado pela isenção, pela imparciabilidade de que já não tem necessidade de mentir, pois deixou o mundo e todas as suas ilusões. Essa é uma das famosas armadilhas machadeanas, pois na verdade, Brás mente, ilude e distorce os fatos, escondendo suas misérias para que sejam vistas como superioridades, exteriorizando uma visão cínica, irônica e desencantada de si mesmo e dos outros.
Pode, ainda, atuar no duplo domínio do vivo e do morto, vendo a morte do ponto de vista da vida, e a vida do ponto de vista da morte; e transita entre o entrar e sair da pele do personagem, podendo falar do ponto de vista do ator e do espectador.
Assim, o aspecto fundamental na análise da narrativa é que a própria possui uma perspectiva dual, através de dois "eus", que são um e o mesmo: o eu-narrante (narrador) e o eu-narrado (protagonista) e que, por sua vez, são os desdobramentos do próprio defunto autor.
O próprio título do livro já gera uma duplicidade entre a vida e a morte. Só quem é vivo é que possui memórias, mas aquilo que é póstumo pertence à morte. O que está entre essa interação é o verme, representado pela passagem do vivo para o morto, e a quem Brás Cubas dedica este livro: “Ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico, como saudosa lembrança, estas Memórias Póstumas”.


“O CORTIÇO”, ALUÍSIO DE AZEVEDO

Na obra “O cortiço, Aluísio Azevedo retrata literariamente a realidade do Brasil no século XIX, sua ideologia e as relações sociais presentes no país de capitalismo incipiente em que o explorador vive perto do explorado.
Numa sociedade periférica como a brasileira, o fenômeno de valorização da cidade se reproduz e se intensifica ainda mais no último terço do século XIX, que se assinala por ser o período em que a presença francesa se fez mais forte e influente no Brasil. Haja vista, por exemplo, a magnitude de que se revestiu o Positivismo entre nós. É nesse contexto que vem a lume O cortiço, obra que retrata a realidade urbana do Rio de Janeiro a partir de um texto literário.
Aluisio Azevedo, o criador da corrente naturalista no Brasil, alcança produzir um rico e diversificado panorama da então capital do Império, num romance bem sucedido que, entretanto, não se propõe somente a este objetivo, uma vez que, como o próprio título indica, dedica-se a focalizar as camadas populares, centrando-se na residência coletiva, habitada por uma classe em constituição, a dos trabalhadores manuais livres, em coexistência com os últimos estertores do sistema escravagista.
No século XIX, com a transmigração da família real para o Brasil, a abertura dos portos e a transformação da capital da colônia em sede do reino, depois império, a sociedade se complexifica e consequentemente a cidade cresce e se povoa de "gente graúda" e "gente miúda". O primeiro grupo se compõe basicamente de estrangeiros ricos, que vão integrar a elite social: ingleses financistas, franceses do comércio de luxo, portugueses atacadistas. Somente a última nacionalidade é retratada no romance, através dos dois protagonistas e concorrentes, Miranda e João Romão, que representam dois lados da fortuna e, consequentemente, de comportamento e de posição na sociedade.
O segundo grupo é formado por gente com os mais variados matizes de cor da pele, desde os migrantes internos, provenientes do norte do país como a sensual mulata Rita Baiana ou do interior do estado, todos atraídos pelas possibilidades da embrionária metrópole, até os imigrantes europeus, como os trabalhadores portugueses, italianos e judeus que moram no cortiço. Por sinal sobre eles recaem estereótipos negativos: alguns generalizados, como a barulheira e o mau cheiro do corpo, outros mais específicos, como a avidez do judeu ou a sujeira e a bagunça dos italianos.


“SENTIMENTO DO MUNDO”, CARLOS DRUMMOND DE ANDRADE

Após a fase demolidora de 1922/30, e a partir do decênio de 1930, a literatura brasileira começa a caminhar na direção de seu amadurecimento: consolidação de algumas propostas da fase heróica, estabilização das conquistas novas e certo recuo quanto ao radicalismo de 22.
Autores preocupados com os problemas humanos e sociais de seu tempo propõem um modernismo moderado: caminham para o universal, ampliam a sua temática e inserem novos ingredientes na literatura (socialismo, freudianismo, existencialismo) e equilibram o material linguístico com as normas de linguagem. O rompimento com a perfeição formal acadêmica e o distanciamento com o experimentalismo da I Geração Modernista, permitiram que os poetas dessa época, pudessem cultivar tantos os versos tradicionais como os livres e brancos.
Assim de se apresenta o poeta mineiro, Carlos Drummond de Andrade, o maior representante da poesia modernista brasileira.
Nesta época, encontramos a poesia social e política de denúncias das dilacerações do mundo. A guerra, o sofrimento do homem, o medo, a solidão são constantes. São poesias que refletem os problemas do mundo, do ser humano diante dos regimes totalitários da Segunda Guerra, sentindo-se impotente diante aos acontecimentos.
Esta temática está em “Sentimento do Mundo”. Publicado pela primeira vez em 1940 (tiragem de 150 exemplares, distribuídos entre os amigos), o terceiro trabalho poético de Drummond traz o olhar do poeta sobre o mundo à sua volta e, se o individualismo evidente nos primeiros livros é mais sutil, não é por isto menor.
O eixo de “Sentimento do Mundo” é a consciência individual, mas socializável do sofrimento coletivo. O eu lírico contempla-se a si e ao mundo; e, se muitas vezes o pronome na primeira pessoa desaparece, o poeta se desdobra em uma terceira pessoa. Compõe-se de 28 poemas, tendendo para um olhar crítico e significativamente político. 
É uma poesia engajada, mas sóbria, sem grandes esperanças utópicas ou comprometimentos ideológicos. É também uma tomada de consciência do universo histórico concreto. Sem ser um depoimento, este livro – o primeiro que Drummond escreveu no Rio de Janeiro – leva a marca de consciência literária do final de 1930, impregnada pelas tensões pré-guerra e pela radicalização político-ideológica. A crítica das alienações burguesas abrange não apenas as maneiras de ser e agir, mas as maneiras de sentir.


"VIDAS SECAS", GRACILIANO RAMOS

A prosa de 1930 é chamada de Neo-Realismo pela retomada de alguns aspectos do Realismo-Naturalismo, contudo, com características particulares preservadas.
A literatura estava voltada para a realidade brasileira como forma de manifestar as recentes crises sociais e inquietações da implantação do Estado Novo do governo Vargas e da Primeira Guerra Mundial.
Os romancistas observam com olhos críticos a realidade brasileira, as relações entre o homem e a sociedade. Pelo fato dos romancistas deste período adotar como componente o lado emocional das personagens, faz com que esta fase se diferencie do Naturalismo, onde este item foi descartado.
Nesse clima de denúncia da realidade brasileira, os escritores nordestinos se destacaram porque presenciaram a passagem de um Nordeste medieval para um nordeste inserido na nova realidade capitalista e imperialista. Graciliano Ramos não seria exceção. Engajado nesse clima de denúncia e vivenciando essa nova realidade, procurou exprimir em seus romances toda essa gama de mudanças sociais e psicológicas pelas quais passava o nordeste. Apesar de ser bem viajado e de conhecer costumes de outras terras, foi no Nordeste que encontrou solo propício ao desenvolvimento dos seus romances. Ele respirava nordeste. Comia nordeste. Vivia o nordeste. Tal constatação se explica em suas linhas romanescas, nas quais procurou imprimir sua marca registrada – o cotidiano da psicologia nordestina.
"Vidas Secas" é, sem dúvida alguma, uma obra de arte incomparável. No romance ajustam-se perfeitamente: linguagem, tema, desenvolvimento e objetivos. O fato dos capítulos serem quase independentes não prejudica a unidade da obra. Ao contrário. A vida, a realidade, a própria verdade também são fragmentadas. A ordem dos fatos, das coisas é uma ilusão, fruto de uma convenção (como a própria língua), de maneira que ao escrever um romance fragmentado que pretende retratar ou recriar a "realidade fragmentada" do sertanejo, Graciliano Ramos não fez mais do que adequar a vida à arte.
A obra é comporta por treze capítulos autônomos, que se encaixam de forma descontínua, com um raro talento artístico. Para alguns, “Vidas Secas” pertence a um gênero intermediário entre romance e livro de contos; é formado de cenas e episódios mais ou menos isolados; mas de tal forma solidários que só no contexto adquirem sentido pleno. A continuidade textual explícita somente se opera entre os capítulos 10 /11 e 12/13.
A ideia de escrever os capítulos como se fossem contos era um artifício utilizado pelo escritor pra ganhar mais dinheiro, publicando-os isoladamente em jornais e revistas à medida que os produzia.
O sentimento da terra nordestina é o fio condutor da narrativa, materializado nos ásperos e cruéis embates do homem com a natureza da região.  Para tanto se encaminhou para descrição e o estudo das relações humanas em sociedade, lugares, paisagens, cenas, épocas, acontecimentos, personagens-padrão, tipos sociais, convenções, usos e costumes do país, criando assim uma tradição literária de mostrar o Brasil, ou seja, ampliar a visão da terra e do homem brasileiro.
Entretanto, face á desejada e imposta exigência da verossimilhança nos temas regionais era muito difícil atingi-la, pois “a língua e os costumes descritos eram próximos aos da cidade, apresentando difícil problema de estilização: de respeito a uma realidade que não se podia fantasiar” (Antonio Candido, j.c., p 116), pelo que restou certo artificialismo no gênero.
Assim, na década de 30, “o panorama literário apresentava em primeiro plano, a ficção regionalista, o ensaísmo social”.
”A sua paisagem nos é familiar: o Nordeste decadente, as agruras das classes médias no começo da fase urbanizadora, os conflitos internos da burguesia provinciana e cosmopolita”. (Alfredo Bossi, j. c., p. 434/435).
Neste panorama, se faz a contextualização de
Vidas Secas no quadro da literatura de 30, vez que, a obra com as matizes do regionalismo, faz um retrato real, cruel e brutal das relações sociais, nitidamente, feudais imperantes no Nordeste do Brasil na época, servindo para demonstrar de forma violenta, com traços do realismo, que aqueles fatos embora até aceitos pela sociedade local, causavam graves lesões ao tecido da pessoa humana, por isto há menos tipos, espaços e condições exóticas, todas inerentes e exigidas pela tradição regionalista do século XIX, que assim, ganha novos contornos, onde a realidade sócio-econômica, também passa a ter grande e quiçá maior relevo.
Por tais motivos,
Vidas Secas é uma obra pela sua formação e conteúdo singular na literatura, embora faça uma análise das condições sociais do Nordeste do Brasil o que é inerente ao contexto da literatura da época.
Graciliano Ramos penetra no pensamento, na carne e na alma de cada um dos membros da família de Fabiano, visando mostrar de forma brutal a discriminação, a cultura e a realidade do sertanejo nordestino.
O “sentido da vida” ou os porquês de tantas desgraças são os temas pelos quais tudo de desenrola, aliás o próprio título da obra endossa esta tese, vez que seca, na linguagem popular, segundo o Aurélio, tem o significado de “má sorte” ou azar, portanto Vidas Secas tem a inteligência de Vidas sem sorte, o que reporta à razão e ao sentido desta existência desafortunada.


“CAPITÃES DA AREIA”, JORGE AMADO

Jorge Amado é um grande expoente do modernismo brasileiro. Sua maturidade literária se revela na capacidade de mesclar realismo e romantismo, lirismo poético e documento em sua narrativa, cuja linguagem explicita o falar de um povo e cuja ideologia se sobrepõe na forma de uma necessidade premente de justiça social.
A obra “Capitães da areia” é diferente dos demais romances de Jorge Amado não apenas por sua temática, mas também em virtude de sua estrutura sui generis. A rigor, podemos dizer que o romance não tem propriamente um enredo. É aí que reside sua modernidade, pois o autor rompe com a tradição do romance convencional, que supunha rigorosa organização dos fatos e relações de causa e efeito entre os eventos.          A obra é montada por meio de quadros mais ou menos independentes, que registram as andanças das personagens pela cidade de Salvador. Mas não só: ao lado da narração propriamente dita, Jorge Amado intercala também notícias de jornal, bem como pequenas reflexões poéticas. A força da narrativa advém do enredo solto, maleável, que parece flutuar ao sabor das aventuras dos pequeninos heróis.
De acordo com a teoria da literatura, há vários tipos de romance e os mais conhecidos são os de ação e de personagem. “Capitães da areia” pertence ao segundo tipo, porque, mais do que desenrolar uma ação, privilegia a existência, a movimentação de diferentes tipos sociais. Dessa maneira, Jorge Amado monta uma galeria bastante ampla de figuras que irão compor o quadro social de uma comunidade.
O fato de o escritor se prender às personagens e de montar os quadros soltos não implica, contudo, que o romance deixe de ter uma estrutura mais ou menos organizada. Pelo contrário, é possível perceber uma linha conduzida, ainda que de maneira tênue, por Pedro Bala, que organiza o grupo, determina-lhe a ação, graças à sua coragem e aos seus princípios, e que será uma das únicas personagens a fugir da alienação (juntamente com o Professor e Pirulito).
Outro aspecto que chama a atenção, no que diz respeito à estruturação da narrativa, é a divisão em partes do romance. Ao todo, são três, subdivididas em capítulos ora mais longos, ora mais curtos, precedidas de um pequeno prólogo de caráter jornalístico, que caracterizam e mostram diversas visões sobre o caso.
O espaço em “Capitães da areia” tem função capital, pois não só determinará o comportamento das personagens, como também quase chega a se constituir numa personagem, com vida própria. Como determinante, divide-se em diferentes segmentos.    O mais amplo deles será obviamente a cidade da Bahia, com todos os seus recantos, limitada pelo mar. Outros espaços poderiam ser considerados, como a cidade do Rio de Janeiro, a cidade de Ilhéus e o Sertão, contudo, têm eles valor secundário, porque são apenas referidos pelo narrador (é para lá que vão o Professor, o Gato e o Volta-Seca, respectivamente).
Na cidade da Bahia, destaca-se de maneira evidente o trapiche, onde moram as crianças. É nele que os meninos abandonados encontram abrigo contra as intempéries e contra os inimigos. Situado na areia, junto ao mar, constitui um espaço de ninguém, e o fato de ter servido no passado como armazém e agora como o lar dos meninos de rua serve para ilustrar um desvirtuamento de função e a condição de marginalidade das crianças. Isso porque ele, ao mesmo tempo, pertence e não pertence à cidade que parece querer evitar os desvalidos da sorte, condenando-os a viver num espaço semidestruído, abandonado, que serve de pousada para ratos e cães.
O tempo, relativamente extenso, mas impreciso, compreende um retalho da vida dos meninos, desde a infância até a maturidade. Contudo, o leitor tem a oportunidade de conhecer com mais intensidade o tempo da adolescência, já que o tempo da infância das crianças comparece por meio de analepses (retorno ao passado), fórmula de que o narrador lança mão para mostrar a formação delas e as razões do desamparado no presente.



quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

BARROCO MONUMENTAL

I - DADOS CRONOLÓGICOS:

Século XVII

II – CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL:

Arte contra-reformista, desenvolvida nos países católicos e seus receptores são os fiéis, a Igreja, a Nobreza e o Palácio (público privado).
O conceito do teatro explora a ideia de representação nos planos políticos (governante era o representante de Deus na terra, representação do que está acima dos fiéis), a representação dos papéis sociais, quem você é na sociedade e a representação religiosa (quase sempre de maneira alegórica, figuras e elementos simbólicos metafóricos, por exemplo, ancora para fé, estrela, para graça, etc).
Atinge com mais eficácia o consciente das pessoas, a fé não é razão e esse sentimento é mais fácil ser despertado que os discursos literários.
O teatro se apóia num conceito de local da representação (aspecto físico) de nome cenário (lugar que você cria um ambiente, uma ilusão).

Scena” igual a palco, fundo em italiano e em francês “décor”.
 Décoration (ornamentação) parte da raiz “decorum” tradução do grego “prépon”.

No Brasil decoro relaciona-se a pudor (moral); no entanto, é ética (costumes socialmente admitidos consensualmente).
Ético ajusta ou não a uma situação como você se coloca em relação a um grupo e não é codificado. A moral é código e tem relação com a religião.

A moral diz: não pode; a ética diz: não deve.

Ética vem de etiqueta, “ethos” (grego, costumes).

A maneira decorosa é a adequação conveniente e não é moral, pois não é nem bom ou mau. Exemplo: os gêneros teatrais: tragédia ou na comédia trágica, um palhaço fazendo piadas não seria adequado, só funcionaria numa sátira.
A arte pode mostrar tudo, mas como você mostra, depende do contexto que é empregada.


III – GÊNEROS:

Os gêneros são:

TRAGÉDIA – classe superior: rei, príncipes, deuses e heróis, desenvolvidos em lugares importantes, como palácios e templos.
COMÉDIA – classe média e desenvolvida nas cidades e aldeias. Retrata os costumes, mas não é necessariamente engraçada.
SÁTIRA – classe inferior. Pessoas marginalizadas, prostitutas, ladrões ou mitológicos baixos. Desenvolvida nos casebres, nos matos. São as farsas e remetem ao riso.
As condições sociais eram fixas, estática e as pessoas tem obrigação de conhecer as regras da sua sociedade.
No século XVII podia diversificar os gêneros, mas era um grande risco, para não causar pena ou riso.
Baltazar Grecián (cortesão) escreve “O discurso” explicando que o mundo é formado por dois tipos de público: os néscios e os discretos.
DISCRETOS – aqueles que têm ética, decoro, sppezzatura.
NÉSCIO – o tolo, o espontâneo. Estes não têm lugar na vida pública (fala e se comporta sem decoro). Ele é natural e não representa, tornando-se alvo de ridículo, servindo para divertir os outros. Ele é ruim porque não tem valor, vive só para servir.
Na literatura são conhecidos como pícaros.

IV – CARACTERÍSTICAS:

 Monumental porque é grandiosa ou parece ser.

Um traço original do Barroco espanhol encontra-se na arquitetura, principalmente nas portadas dos edifícios civis e religiosos, decoradas em relevo.
A pintura espanhola foi muito influenciada pelo Barroco italiano, principalmente no uso expressivo de luz e sombra, mas conservou preocupações próprias: o realismo e o domínio da técnica.