quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

ALFREDO VOLPI

1896-1988
“Se em algum momento Volpi entrou nos palacetes dessas famílias foi de tamanco e com um balde de cal para pintar as paredes, e não para participar das discussões intelectuais dos modernistas”.
Paulo Prado

Um dos mais populares artistas brasileiros, Volpi (1896-1988) transitou entre o figurativismo e o abstracionismo de forma contínua. Seu período de maior radicalismo na abstração foi nos anos 50, quando expõe junto com os artistas concretos. Obras como “Composição Concreta” revelam o domínio do artista no geometrismo, mas sua popularidade advém especialmente da forma como apreende temas vernaculares, como as famosas bandeirinhas, e os transpõe para as telas. O artista foi tema de mostra no Museu de Arte Moderna de São Paulo neste ano.” (FGV)

Nasceu na Itália e veio para o Brasil com pouco mais de um ano de idade. Residiu em São Paulo e teve várias profissões: carpinteiro, encanador e pintor de paredes. Aos quinze anos de idade começou a trabalhar como pintor-decorador de paredes. Ele fazia desenhos e pinturas de faixas decorativas nas paredes das casas de famílias ricas de São Paulo. Andando pelos arredores da cidade de São Paulo, observava a paisagem, as cores e a luminosidade. Pintava ao ar livre, junto à natureza, assemelhando-se aos impressionistas.

Aos 29 anos de idade, o operário Volpi pôde, enfim, participar de uma mostra de pintura no Palácio das Indústrias, em São Paulo, com o quadro “Minha irmã costurando”

Volpi traçava linhas, fazia contornos e preenchia-as com cores. Para ele, interessava mais a forma do que o conteúdo.
Mas, chamar Volpi de o pintor de bandeirinhas” soa como uma ofensa. “Afinal, não eram propriamente bandeirinhas. Aliás, passavam longe da intenção de ser referência direta a esse símbolo da tradicional festa junina brasileira.


“Esse propósito rendeu ao artista o título de melhor pintor do País, como definiu a imprensa na década de 1970. Mas a idéia de que os elementos formais seriam mais importantes do que a narrativa lhe custou um mal-entendido: a noção de que Volpi teria sido um pintor construtivista.” (BIEN’ART abril 2006)

Volpi também pintou telas e afrescos religiosos. Em 1951, pintou afrescos na Capela do Cristo Operário, em São Paulo.




Em 1958, fez os afrescos da Capela de Nossa Senhora de Fátima, em Brasília, mas teve sua obra destruída antes da inauguração por ter sido considerada inadequada pelos padres. Oito anos mais tarde, pintou o afresco Dom Bosco, no Palácio do Itamaraty, em Brasília.

Novas construções com velhos temas foram surgindo. Nos últimos anos as bandeiras adquiriram mastros, transformaram-se em velas de barcos.


Nos anos 80, observando a cidade e suas transformações, interpretou a paisagem de São Paulo, com seus prédios sobrepostos no horizonte, as cores, a velocidade e o dinamismo da cidade grande.

Volpi foi um artista tardio, ao contrário do que costuma acontecer entre artistas brasileiros. Em sua primeira exposição individual, tinha quase 50 anos. Mesmo assim, sua obra ganhou enorme reconhecimento pela qualidade única.
Alfredo Volpi passou os últimos anos de sua vida pintando em seu ateliê: cigarro de palha na boca, camisas confortáveis e tênis, trabalhando ao som baixinho da televisão.
Quando a noite chegava, não dispensava uma boa sopa de alho. De vez em quando jogava paciência, um jogo individual em que as cartas são dispostas geometricamente, talvez parodiando sua própria arte...

Volpi um dia declarou:
Eu não pinto bandeirinha, quem pinta bandeirinha é o Pennacchi”. Se referia ao colega, também italiano, ligado ao grupo Santa Helena, que pintava paisagens imaginárias, com montanhas, igrejas, personagens e, claro, bandeirinhas. Nas mãos de Pennacchi, essas figuras representam simplesmente aquilo que eram. Mas, nas mãos de Volpi viraram fenômenos formais riquíssimos, e não simples narrativas. Volpi era muito original.” (BIEN’ART Abril 2006)

Volpi faleceu a 28 de maio de 1988: uma vida comum demais para quem foi incomum como poucos.






Em 1927, conheceu Judith, seu grande amor e sua modelo para o quadro “Mulata”, obra que apresenta as primeiras referências modernistas do trabalho de Volpi: o olhar, o movimento do rosto, do corpo da mulher; dando-nos a impressão que o artista capturou o momento exato em que a modelo se virava bruscamente.


Em 1928, participou do Salão de Belas Artes, organizado para artistas imigrantes italianos, e ganhou a Medalha de Ouro, seu primeiro prêmio. A arte de Volpi começava a ser reconhecida.

Na década de 1930 conheceu Rebolo e o Grupo Santa Helena, presença discreta na arte brasileira diante da agitação provocada pelos modernistas da Semana de 22 (aliás, o modernismo foi feito por uma elite à qual o imigrante Volpi não pertencia).

“Em 1971 foi demolido no centro de São Paulo, na Praça da Sé, um conjunto de prédios do qual fazia parte o Edifício Santa Helena, que abrigava escritórios. Quarenta anos antes, um dos escritórios era ocupado pelo pintor de paredes paulistano Rebolo (1902-1980), que aí recebia os pedidos de serviço. Interessado por arte, ele era visitado por outros trabalhadores com o mesmo interesse; entre eles, Alfredo Volpi. Esses artistas integraram o Grupo Santa Helena e tinham em comum a origem humilde e o gosto pela pintura.”

Os primeiros quadros de Volpi foram paisagens, interiores e figuras humanas, refletiam ainda uma vontade de retratar a realidade.
Durante as décadas de 30 e 40, Volpi intensificou sua participação em exposições e fez contatos importantes com outros artistas, como Bruni Giorgi, Lasar Segall, Tarsila do Amaral e Rossi Osir.

No final da década de 1940, as fachadas e os casarios se intensificaram nas criações de Volpi. Ele os pintou mais simplificados, coloridos, geométricos, abstratos. Nessa época começou a pintar com têmpera, um tipo de tinta quer ele mesmo preparava misturando clara e gema de ovos, óleo de cravo e pigmentos coloridos. Também fazia a moldura e esticava o tecido da tela de linho.

Combinar cores tornou-se sua linguagem preferida.
“Você põe a primeira cor. Olha. Ai põe a segunda. Olha de novo. Se está certo você vê. Se está errado, você percebe e apaga. E começa tudo de novo”, dizia o artista.



A partir de 1950 ele deu início a suas obras mais significativas: fachadas de casarios, mastros, bandeiras e fitas. Mas Volpi não pintava esses temas imitando a realidade: trabalhava valorizando apenas as linhas e as cores. Nesse período, viajou para a Europa, participou das Bienais Internacionais de São Paulo e da Bienal de Veneza, além de fazer uma exposição em Nova York.

Na II Bienal de São Paulo, em 1953, recebeu o prêmio de Melhor Pintor Nacional, junto com Di Cavalcanti.
Nesse tempo o Concretismo atingia as artes brasileiras na poesia, na escultura, na pintura, no paisagismo, na música. O trabalho de Alfredo Volpi chamou a atenção dos concretistas, que o adotaram como seu representante nas artes plásticas.

Para Olívio Tavares de Araújo, curador da mostra “Volpi: a Música da Cor”:

Um dos pontos-chave dessa visão é desfazer de uma vez por todas a suposta ligação estreita de Volpi com o concretismo. Olívio explica que essa relação se iniciou, em 1955, quando os idealizadores do movimento convidaram Volpi para participar de sua primeira exposição.

Ele poderia ser quase um patrono que legitimaria uma arte ortodoxalmente geométrica. Volpi, que realmente fazia uma arte geométrica, acabara de ganhar o prêmio da Bienal. Ele aceitou o convite e fez quadros inteiramente abstratos. Era como se emprestasse seu prestígio a eles, com quem permaneceu ligado por mais de um ano. Não é correto ler Volpi como concretista.”

É claro que a obra do pintor traduz a natureza por um viés geometrizante: casas, fachadas, telhados e bandeiras viram linhas retas ou curvas, retângulos, círculos, quadrados. Mas, diferentemente do purismo concretista, Volpi não buscava eliminar o elemento subjetivo, expressivo, confessional e lírico.

Certa vez, Décio Pignatari, um dos mentores do Concretismo, perguntou a Volpi o que significou o movimento para ele.

“Não sei, nunca pensei nisso”, respondeu o pintor. “Foi uma resposta tipicamente volpiana. Pensar nas coisas não era do seu feitio. O perfil dele, um artesão e ex-operário, era fazer as coisas e não teorizar sobre elas. Ele era totalmente avesso a discussões teóricas. Queria produzir seus quadros. Os concretistas eram o oposto, eram programáticos, discutiam a própria natureza da arte.”

Volpi, então, passa a pintar obras autenticamente concretas, aproximando-se da arte óptica americana (“optical art”), em que as imagens mudam de significado dependendo das cores e de como se olha para elas. O artista desenhava as partes de um todo e o todo separado em partes, como se brincasse com as formas geométricas.

O espírito observador do pintor o fez descobrir um novo caminho para sua arte: as ruas e as casas enfeitadas durantes as festas juninas. Ao incorporar as formas das bandeirinhas em seus quadros, Volpi anunciava a nova fase: “

A gente se desliga e então só passa a existir o problema da linha, forma e cor. (...) Minhas bandeirinhas não são bandeirinha; são só o problema das bandeirinhas”.

As bandeirinhas se tornaram sua linguagem mais conhecida e foram constantes em sua obra. Parecia que Volpi tinha um prazer imenso em descobrir novas formas de pintá-las. Ele as transformava, mudando-as de posição, de tamanho, de cores, retirando e colocando pedaços.

BANDEIRINHA (1958) de Alfredo Volpi – coleção MAC-USP

Um comentário:

Unknown disse...

Se você quer deliciar-se com Vitrais * Afrescos & Bandeirinhas de Volpi... E passear entre ‎jardins criados por Burle Max e isso num mesmo espaço.‎

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Cecél Garcia