terça-feira, 2 de novembro de 2010

Tropicalismo



TROPICÁLIA

Sobre a cabeça os aviões
Sob os meus pés os caminhões
Aponta contra os chapadões
Meu nariz

Eu organizo o movimento
Eu oriento o carnaval
Eu inauguro o monumento
No Planalto Central
Do país

Viva a bossa sa sa
Viva a palhoça ça ça ça ça

O monumento é de papel crepom e prata
Os olhos verdes da mulata
A cabeleira esconde atrás da verde mata
O luar do sertão

O monumento não tem porta
A entrada é uma rua antiga, estreita e torta
E no joelho uma criança sorridente, feia e morta
Estende a mão

Viva a mata ta ta
Viva a mulata ta ta ta ta

No pátio interno há uma piscina
Com água azul de amaralina
Coqueiro brisa e fala nordestina e faróis

Na mão direita tem uma roseira
Autenticando eterna primavera
E nos jardins os urubus passeiam
A tarde inteira entre os girassóis


Viva Maria iá iá
Viva a Bahia iá iá iá iá

No pulso esquerdo o bang-bang
Em suas veias corre muito pouco sangue
Mas seu coração balança a um samba de tamborim

Emite acordes dissonantes
Pelos cinco mil alto-falantes
Senhoras e Senhores ele põe os olhos grandes
Sobre mim

Viva Iracema ma ma
Viva Ipanema ma ma ma ma

Domingo é o fino da bossa
Segunda-feira está na fossa
Terça-feira vai à roça
Porém

O monumento é bem moderno
Não disse nada do modelo do meu terno
Que tudo mais vá pro inferno
Meu bem

Viva a banda da da
Carmem Miranda da da da da


O Tropicalismo representa um choque comportamental, político, ideológico e estético do fim da década de 60.
Após a explosão inicial, o Tropicalismo transformou-se num termo corrente da indústria cultural e da mídia.

Baseando-se na contracultura, com a utilização de valores diferentes dos aceitos pela cultura dominante, fazendo uso do deboche, da ironia, da irreverência e da improvisação, revoluciona a cultura artística da época, principalmente a musical, onde a música popular brasileira, até então era pela estética da bossa nova.


O movimento é lançado em 1967, com a apresentação das músicas Alegria, Alegria, de Caetano, e Domingo no Parque, de Gil no III Festival de Música Popular da TV Record.




Foi tumultuado o último dia de inscrições do III Festival da TV Record. Entre os retardatários estavam Chico Buarque e Edu Lobo, que deixaram para se inscrever na tarde do último dia. Mais de quatro mil músicas foram inscritas na disputa por 25 milhões de cruzeiros e pelo troféu Viola de Ouro para o primeiro colocado, 10 milhões para o segundo, 7 milhões para o terceiro, 5 milhões para o quarto e 3 milhões para o quinto. O melhor intérprete ficaria com a Viola de Prata. Dessa vez, além das partituras os concorrentes também entregaram gravações das canções inscritas.




Entre os compositores das 30 músicas selecionadas estavam a dupla vencedora do I FIC, Dori Caymmi e Nelson Motta (O Cantador), Luís Carlos Paraná (Maria, Carnaval e Cinzas), Pixinguinha e Hermínio Bello de Carvalho (Isso Não Se Faz), Johnny Alf (Eu e a Brisa), Geraldo Vandré e Hilton Acioly (Ventania), Chico Buarque (Roda Viva), Edu Lobo (Ponteio), Gilberto Gil (Domingo no Parque), outra de Gil em parceria com sua mulher Nana Caymmi (Bom Dia) e Sérgio Ricardo (Beto Bom de Bola). Entre os novatos, Renato Teixeira com “Dadá Maria”, Toquinho e Vitor Martins com “Belinha”, Sidney Miller (A Estrada e o Violeiro), Antônio Carlos Pinto (Festa no Terreiro de Araketu) e Martinho José Ferreira, que mais tarde seria conhecido como Martinho da Vila (Menina Moça).
Vários compositores assumiram também a posição de intérpretes, depois de perceberem que os cantores acabavam recebendo um reconhecimento muito maior que os compositores. Foram definidos como intérpretes Edu Lobo, Sérgio Ricardo, Caetano Veloso, Demetrius, Erasmo Carlos, Sidney Miller, Adilson Godoy, Geraldo Vandré, Chico Buarque e Gilberto Gil, sendo que com exceção de Chico, os outros pisariam no palco pela primeira vez. Roberto Carlos, Elis, Claudete Soares, Jair Rodrigues, MPB4, Ronnie Von, Wilson Simonal, Elza Soares, Sílvio César, Gal Costa, Márcia, Jamelão, Agnaldo Rayol, Maria Creusa e até Hebe Camargo também estariam no palco do III Festival.
A Philips, que mantinha em seu cast 18 dos artistas classificados, decidiu lançar três LPs com as 36 músicas selecionadas, usando outros 18 artistas da gravadora para as músicas restantes.
No dia 14 de setembro, os 12 integrantes de cada uma das três eliminatórias foram divulgados. As dificuldades junto à Censura complicaram a escolha do júri, que deveria equilibrar tendências esquerdistas e direitistas, evitando vantagens para qualquer um dos lados e mantendo um equilíbrio técnico e político. Todas as músicas só foram liberadas após a aprovação da Polícia Federal, que depois de avaliá-las, convocava Paulinho Machado de Carvalho, da TV Record, e indicava o que deveria ser modificado.
Torcidas organizadas tomaram conta dos dois mil lugares do Teatro Record na primeira eliminatória. O LP com as 12 músicas da etapa foi apresentado ao público pelos apresentadores, em uma enorme jogada de marketing da gravadora. Logo em seguida a primeira música foi anunciada: “O Combatente”, com o Quarteto Novo, Jair Rodrigues, com uma interpretação virtuosa e o próprio Walter Santos ao violão. Na sequência, Gal Costa e Sílvio César, cantaram “Dada Maria”, do estreante Renato Teixeira.
Depois de “E Fim”, com a autora Sônia Rosa, viria um dos momentos mais esperados da noite, Chico Buarque, acompanhado pelo Som Três e o MPB4, subiu ao palco para defender sua “Roda Viva”, recebida com entusiasmo e fortes aplausos pelo público. “Ponteio” foi representada com perfeição por Edu Lobo, Quarteto Novo, Momento Quatro e Marília Medalha sendo imediatamente considerada uma das finalistas. A canção de Johnny Alf, “Eu e a Brisa”, interpretada por Márcia e que mais tarde viria a ser considerada uma de suas maiores obras primas não causou nenhum tipo de reação na platéia.
Na sequência, “Minha Gente” interpretada por Demetrius, “Ela Felicidade” com Claudete Soares, e “O Milagre” com Wilson Simonal não animaram o público. Em compensação, Roberto Carlos levantou os fãs do iê-iê-iê com o samba “Maria, Carnaval e Cinzas”, de Luis Carlos Paraná. A última música da noite, defendida por Nana Caymmi, com Gilberto Gil ao violão, foi “Bom Dia”. Classificaram-se “Bom Dia”, “Ponteio”, “Roda Viva” e “Maria, Carnaval e Cinzas”.
A segunda eliminatória, no dia 6 de outubro, teve como primeira concorrente a bossa romântica “Rua Antiga” de Roberto Menescal, como grupo vocal O Quarteto. Em seguida, “Brinquedo” com Claudete Soares. As duas só foram aplaudidas no final. O clima esquentou com a entrada de Simonal para defender “Belinha”, de Toquinho, que tocava violão ao seu lado, e Vitor Martins, muito aplaudida pelo público. A quarta concorrente foi “Por Causa de Maria”, com Sílvio César e os Titulares do Ritmo.
O público demonstrou entusiasmo com a canção seguinte: “Domingo no Parque”, de Gilberto Gil, que se apresentou acompanhado pela banda Mutantes, juntando seu violão, guitarra e baixo elétrico ao tradicional berimbau. Para Carlos Imperial, autor de “Uma Dúzia de Rosas”, houve uma vaia generalizada. Ronnie Von, o próximo a se apresentar e os Golden Boys, que acompanharam Adilson Godoy no samba “Manhã de Primavera”, também foram vítimas das vaias dos que se colocavam contra o iê- iê-iê. A noite ainda contou com a apresentação de “Diana Pastora” com o grupo Momento Quatro.
Elis defendeu “O Cantador” com a afinação impecável que lhe era peculiar, já Nara Leão e Sidney Miller cantaram hesitantes para um público que se cansou dos 70 versos de “A Estrada e o Violeiro”. Fechando a noite, Jair Rodrigues cantou “Samba de Maria” para uma plateia inconformada com a desclassificação de “O Combatente” defendida por ele na etapa anterior. Nesta eliminatória os classificados foram: “Domingo no Parque”, “O Cantador”, “A Estrada e o Violeiro” e “Samba de Maria”.
As entradas para a terceira eliminatória e para a final se esgotaram uma semana antes. Apreensivos com as vaias, cantores e compositores tentavam adivinhar quem seriam os vaiados da noite. O espetáculo começou com Geraldo Vandré e Quarteto Novo com
“Ventania”, na qual o boiadeiro de “Disparada” largava o cavalo para se tornar chofer de caminhão. Simonal apresentou “Balada do Vietnã”, Agnaldo Rayol, “Anda Que Te Anda”, ambas consideradas fracas. Neste clima aterrador, o MPB4 levantou o público com o frevo “Gabriela”, de Chico Maranhão”. A quinta concorrente foi um lindo samba de Pixinguinha, “Isso Não Se Faz”, cantado por Elza Soares, na sequência, outro samba, dessa vez, de Martinho da Vila, “Menina Moça”. Sérgio Ricardo foi responsável por um dos episódios mais marcantes dessa edição ao não conseguiu emplacar a sua “Beto Bom de Bola”.
Maria Odete passou em brancas nuvens com “Canção do Cangaceiro”, enquanto Erasmo Carlos teve sua “Capoeirada” mal compreendida, apesar da melodia ter atraído o arranjador canadense Percy Faith, que a gravou com sua orquestra e coral. O candomblé “Festa no Terreiro de Alaketu” foi cantado com mérito pela baiana Maria Creusa.
A grande vaia da noite foi para Hebe Camargo, que interpretou “Volta Amanhã”, considerada previsível e sem consistência. Em contraste, a última música foi a mais aplaudida: “Alegria, Alegria”, de Caetano Veloso, classificada para a final. As outras três selecionadas foram: “Ventania”, “Gabriela” e “Beto Bom de Bola”, esta última extremamente vaiada.
Sábado, 21 de outubro. É hora da final. Pela segunda vez em sua trajetória pelos festivais, Nana Caymmi foi extremamente vaiada ao cantar “Bom Dia”. Nara Leão e Sidney Miller foram os segundos a se apresentar e dessa vez conseguiram dominar a inquietação do público. Caetano foi recebido com flores pela platéia que já sabia de cor a letra de sua “Alegria, Alegria”. Gil e os Mutantes, que entraram logo a seguir, também foram recebidos com aplausos. Mais uma vez o público se acabou de dançar com o frevo “Gabriela”, sombrinhas e guarda-chuvas foram abertos animando a festa. “O Cantador” interpretada por Elis Regina foi recebida com gritos de “Já ganhou!”.
Logo após, Sérgio Ricardo foi protagonista de um das mais polêmicas situações da história dos festivais. Sua “Beto Bom de Bola” mais uma vez foi intensamente vaiada pela platéia, chegando a encobrir a voz de Sérgio, que inconformado arrancou o microfone do pedestal e proclamou: “Vocês ganharam! Vocês ganharam! Mas isso é o Brasil não desenvolvido. Vocês são uns animais!”. Transtornado, ergueu o violão, arrebentando-o contra um pedestal e atirando-o à platéia. Essa atitude fez com que “Beto Bom de Bola” fosse desclassificada. Preocupados com a situação, Edu e Marília entraram apreensivos no palco para apresentarem “Ponteio”, que ao final saiu consagrada.
Faltavam ainda quatro músicas. Vandré cantou “Ventania”, Roberto Carlos, “Maria, Carnaval e Cinzas”, Chico Buarque, recebido de pé apresentou “Roda Viva”, que possuía um dos mais perfeitos arranjos de toda a Era dos Festivais e finalmente Jair Rodrigues, intensamente vaiado.
Depois de meia hora de intervalo, o resultado. Elis Regina foi escolhida a melhor intérprete, Sidney Miller ganhou o prêmio de melhor letra. Em sexto lugar “Gabriela”, em quinto, “Maria, Carnaval e Cinzas”, resultado que gerou muitas vaias ao intérprete Roberto Carlos. O anúncio de “Alegria, Alegria”, como quarta colocada, fez com que o público mais uma vez se manifestasse pedindo “Primeiro!” O terceiro lugar ficou para “Roda Viva” de Chico Buarque e o segundo para Gilberto Gil, com “Domingo no Parque”, que rendeu ainda um prêmio especial de melhor arranjo para Rogério Duprat. Com “Ponteio”, Edu Lobo se consagraria pela segunda vez como vencedor de um festival de música popular, ovacionado pelo público.
O III Festival da Record, além de revelar a evolução dos artistas baianos Caetano e Gil, deixou claro a mudança no comportamento da platéia formada, em sua maioria, por estudantes sintonizados com canções que falavam sobre a realidade social brasileira, utilizando-as como forma de expressão de sua insatisfação com a ditadura militar.
Acompanhadas por guitarras elétricas, as canções causaram polêmica com uma classe média universitária nacionalista, contrária às influências estrangeiras nas artes brasileiras, pois o Tropicalismo adotou as idéias do Manifesto Antropofágico de Oswald de Andrade para aproveitar elementos estrangeiros que entravam no país e, por meio de sua fusão com a cultura brasileira, criaram um novo produto artístico.
O III FESTIVAL DA MPB foi transmitido pela TV Record em outubro, 1967, e realizado no Teatro Paramount, conhecido como O FESTIVAL DA VIRADA os vencedores levavam o prêmio sabiá de ouro.


1º - Ponteio, de Edu Lobo e Capinan, com Edu Lobo e Marília Medalha, Quarteto Novo e Momento Quatro.




2º - Domingo no parque, de Gilberto Gil, com Gilberto Gil e Os Mutantes.





3º - Roda viva, de Chico Buarque, com Chico Buarque e MPB-4.




4º - Alegria, alegria, de Caetano Veloso, com Caetano Veloso e Beat Boys.



5º - Maria, carnaval e cinzas, de Luiz Carlos Paraná, com Roberto Carlos.


Melhor Intérprete da 3º edição do festival:
Elis Regina - O Cantador (Dori Caymmi e Nelson Motta)



Momento Marcante do III Festival de MPB - Sérgio Ricardo.


O lançamento do LP Tropicália ou Panis et Circensis (agosto, 1968), considerado o Manifesto Tropicalista, foi o grande acontecimento musical do movimento. Fazendo uma miscelânea de gêneros, vai da estética brega do tango-dramalhão Coração Materno (opereta grotesca), de Vicente Celestino (1894-1968) que na voz de Caetano oscila entre a blague dadaísta ao se utilizar de uma música desvalorizada pelo gosto vigente na MPB, justamente para problematizá-la à influência dos Beatles e do rock, cantada por Os Mutantes.



O refinamento da bossa nova está presente nos arranjos de Rogério Duprat, nos vocais de Caetano e na presença de Nara Leão. O LP trazia uma colagem de sons, ritmos populares, nacionais, internacionais, citações poéticas, paródias, ironias, sátiras, inclusão de fragmentos sonoros e citações poéticas. Enfim, um mosaico cultural!


“Essa consciência tiveram Caetano e Gil, que souberam sentir o momento exato em que a própria massa espera que o artista não se repita. Essa consciência faltou a Vandré, por exemplo, a quem escapou este paralelo com sua própria estória: assim como o boiadeiro troca o cavalo pelo caminhão, o violeiro acaba seduzido a trocar a viola pela guitarra elétrica”, afirma Gilberto Mendes.

“Explosão Tropicalista”, denominação utilizada por Celso Favaretto, demonstra o impacto de ruptura que o movimento teve:

“A mistura tropicalista notabilizou-se como uma forma sui generis de inserção histórica no processo de revisão cultural que se desenvolvia desde o início dos anos 60. Os temas básicos dessa revisão consistiam na redescoberta do Brasil, volta às origens nacionais, internacionalização da cultura, dependência econômica, consumo e conscientização.”


O Tropicalismo foi o produto de uma crise política-cultural e existencialista, tanto do autoritarismo de poder dos anos 60 e as “tensões” que caracterizavam a sociedade brasileira urbana; como também uma crítica no campo estético das artes, revitalizando a discussão do papel histórico, social e estético da vanguarda.
Em 1968, Caetano Veloso, indagado por Augusto de Campos, sobre o que seria o Tropicalismo, movimento musical ou comportamental, ele responde:

“Ambos. E mais ainda: uma moda. Acho bacana tomar isso que a gente está querendo fazer como Tropicalismo. Topar este nome e andar um pouco com ele. Acho bacana. O Tropicalismo é um neo-antropofagismo.”

É certo que o Tropicalismo e seus integrantes eram amados ou odiados com a mesma intensidade.

“Tropicalismo beira a pilantragem (...) Gil com seus gritos não agride a sensibilidade ou os valores, agride fisicamente o ouvido.”

(Chico de Assis, jornalista, crítico, compositor e um dos membros do CPC da UNE)

O Tropicalismo aparece também em outras artes: no teatro, com as experiências inovadoras do Grupo Oficina, nas montagens das peças: O Rei da Vela; no cinema, acompanhando a radicalização das teses do Cinema Novo, em torno do lançamento de Terra em Transe, de Gauber Rocha e nas artes plásticas, as experiências de Hélio Oiticica, campo onde a palavra Tropicália ganhou significado inicial, adquirindo as feições gerais que mais tarde consagraria o movimento.


“Tropicália é um tipo de labirinto fechado, sem caminhos alternativos para a saída. Quando você entra nele não há teto, nos espaços que o espectador circula há elementos táteis. Na medida em que você vai avançando, os sons que você ouve vindos de fora (vozes e todos tipos de som) revelam como tendo sua origem num receptor de televisão que está colocado ali perto. É extraordinário a percepção das imagens que se tem: quando você se senta numa banqueta, as imagens de televisão chegam como se estivessem sentadas à sua volta. Eu quis, neste penetrável, fazer um exercício de imagens em todas as suas formas: as estruturas geométricas fixas (se parece com uma casa japonesa-mondianesca), as imagens táteis, a sensação de caminhada em terreno difícil (no chão há três tipos de coisas: sacos com areia, areia, cascalho e tapetes na parte escura, numa sucessão de uma parte a outra) e a imagem televisiva. (...)
(...) Eu criei um tipo de cena tropical, com plantas, areias, cascalhos. O problema da imagem é colocado aqui objetivamente, mas desde que é um problema universal, eu também propus este problema num contexto que é tipicamente nacional, tropical e brasileiro. Eu quis acentuar a nova linguagem com elementos brasileiros, numa tentativa extremamente ambiciosa em criar uma linguagem que poderia ser nossa, característica nossa, na qual poderíamos nos colocar contra uma imagética internacional da pop e por art, na qual uma boa parte dos nossos artistas tem sucumbido.”

(Hélio Oiticica, obra-ambiência, Tropicália. Museu de Arte Moderna no Rio de Janeiro, 1967)


“Enquanto Oiticica esboça um roteiro para a sua obra-ambiência. Caetano hiperdimensiona a amplitude deste roteiro, transformando a própria ideia de Brasil-nação num imenso “monumento”, ambiência fantasmagórica e fragmentada, onde o espectador-ouvinte tem diante de si um desfile das relíquias arcaicas e modernas do Brasil.” (Mariana Martins Villaça)

A intenção de Oiticica de criar uma nova corrente de vanguarda brasileira, onde “a arte já não é mais instrumento de domínio intelectual; já não poderá mais ser usada como algo supremo, inatingível, prazer do burguês tomador de whisky e do intelectual especulativo’, concretizou em sua obra-ambiência Tropicália.

No teatro a estréia de O Rei da Vela, escrita por Oswald de Andrade (1937) e dirigida por José Celso Martinez Corrêa (1967), chocou o público frequentador de teatro da época. Augusto Boal criticava o “Novo teatro”, como: chacriniano-dercinesno-neo-romântico retomava o teatro “burguês”, incitando uma platéia burguesa a tomar iniciativas individuais contra uma opressão difusa e abstrata.
Acrescenta, ainda: “neo-romântico”, pois só atinge a aparência da sociedade e não a sua essência; é “homeopático”, pois quer criticar a cafonice, endossando-a; é “inarticulado”, pois culmina numa crítica a-sistêmica; é “tímido e gentil” com os valores da burguesia; e, finalmente, não passaria de uma estética “importada”.






Na literatura, a partir de 1968, os integrantes do grupo Noigrandes - Concretismo, identificaram-se com as propostas tropicalistas e o lançamento do livro-manifesto de Augusto de Campos, O Balanço da Bossa, essa aliança torna-se pública.

A obra faz uma restropectiva da memória histórica das vanguardas a partir de 1922 até o Tropicalismo, relacionando tudo que não era Bossa Nova e Tropicalismo como TFM (tradicional Família Musical).

Augusto de Campos analisando as canções Alegria, Alegria e a Banda, afirma:

“Alegria, Alegria é um desabafo-manifesto ante a crise de inseguranças que, gerando outros preconceitos, ameaçava interromper a marcha evolutiva da MPB (...) Furando a maré redundante de “violas” e “marias” a letra de Alegria, Alegria traz o imprevisto da realidade urbana, múltipla e fragmentária, captada isomorficamente, através de uma linguagem nova, também fragmentada.(...)”

“Das duas marchas esta mergulha no passado, na busca evocativa das purezas das bandinhas e dos coretos da infância. “Alegria” ao contrário, se encharca de presente, se envolve diretamente no dia-a-dia da comunicação moderna, urbana, do Brasil e do mundo.”

O movimento chega ao fim com a decretação do Ato Institucional nº 5 (AI-5), em dezembro de 1968. Caetano e Gil são presos, exilam-se no Reino Unido e conforme Campos, Caetano e Gil produziram um happening no III FIC, afirmando que:

“Em síntese, o artista dinamita o código e dinamita o sistema. Caetano, Gil e os Mutantes tiveram a inteligência e a coragem de lançar mais esse desafio e de romper, deliberadamente, com a própria estrutura de festival, dentro do qual os compositores tudo fazem para agradar o público, buscando na subserviência ao código de convenções do ouvinte a indulgência e a aprovação para as suas músicas “festivalesca”.

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