quarta-feira, 26 de janeiro de 2011

PINTURA COM DECORAÇÃO (ROCOCÓ)

I – DADOS CRONOLÓGICOS:

O rococó foi um fantasioso sistema decorativo inventado na França, por volta de 1700, para o tratamento de interiores e objetos ornamentais em geral, como uma fuga ao estilo pomposo e monumental, cujo arquétipo era a Versalhes de Luís XIV.
Nesses campos, a ornamentação e a decoração atingiram o apogeu em Paris, na década de 1730 se propagou as outras artes e outros países, particularmente à Alemanha, e foi mais tarde associado, retrospectivamente, à época de Luís XV.
Até o final do século continuou a ornamentar os luxuosos castelos e igrejas da Alemanha, da Áustria e da Europa Central.

II – CONTEXTO HISTÓRICO-CULTURAL:

O século XVIII na pré-Revolução Francesa foi um período em que as mulheres dominavam as cortes européias.
Madame de Pompadour era regente virtual da França, Maria Teresa reinava na Áustria, Elizabeth e Catarina eram monarcas da Rússia.
As artistas mulheres deixaram sua marca nessa época, sendo as mais notáveis as duas pintoras da rainha Maria Antonieta: ELISABETH VIGÉE-LEBRUN (1755-1842) e ADÉLAIDE LABILLE-GUIARD (1749-1803).
Os retratos muito em moda da pintora veneziana ROSALBA CARRIERA (1675-1757) lançaram o uso de pastéis (lápis de giz, mais tarde usados pelos impressionistas.
O rococó é o mais atraente movimento artístico entre a Renascença e o Impressionismo.
O nome rococó é derivado de “rocaille”, referente a conchas e seixos que ornamentam grotas e fontes.
A arte decorativa foi um campo privilegiado para essa ornamentação delicada, curvilínea. Os pisos eram revestidos com elaborados padrões em folha de madeira, a mobília era ricamente marchetada, decorada com estofamento em gobelin e incrustações em marfim e casco de tartaruga. As roupas, talheres e porcelanas, nesta época, também eram sobrecarregados com desenhos de flores, conchas e folhas.
Até o desenho das carruagens trocava as linhas retas por floreios e arabescos, e os cavalos eram ajaezados com plumas imensas e arreios cravejados de pedras preciosas.

III – CARACTERÍSTICAS:

A arte rococó era tão decorativa e não funcional quanto à aristocracia que a adotou.
Depois da morte de Luís XIV, em 1715, a aristocracia trocou Versalhes por Paris, onde os salões das enfeitadas casas urbanas sintetizavam o estilo rococó.
A nobreza tinha uma vida frívola, dedicada ao prazer, refletida num tipo de pintura bem característico, a “fête galante”, mostrando jovens elegantemente trajados em brincadeiras ao ar livre.
O seu encanto é um lugar comum da crítica moderna; as suas qualidades estão todas do lado da fantasia, espírito, sensibilidade e sorridente facilidade. Ao invés dos movimentos barrocos e neoclássicos que vieram antes e depois dele, o rococó é amoral e intuitivo, não didático, nem intelectual. Não exige antecedentes elaborados de conhecimentos históricos ou teóricos, o seu objetivo essencial é dar prazer.
Um sentido de estilo, elegância até, é a qualidade distintiva da arte rococó. É uma qualidade que se mostra no domínio de um determinado movimento rítmico, a curva-S irregular, cultivada por si própria e manipulada, aparentemente com facilidade, sem esforço.
Damo-nos constantemente conta de uma conscientização artística, de um deleite na beleza da realização, de um prazer decorrente da “coisa bem feita”.
Pertencia à mesma categoria daquelas artes do séc. XVIII que tinham a ver com a comunicação entre duas ou, no máximo, um pequeno grupo de pessoas: a conversação, a epistolografia, a música de câmara, a dança, as boas maneiras, a sedução.
Assim, o ROCOCÓ não era uma arte pública, como o BARROCO, nem uma arte solitária, como o IMPRESSIONISMO, mas uma arte própria de uma sociedade polida.

CONCLUSÃO:

CLIMA: leve, vivaz, superficial e cheio de energia
DECORAÇÃO INTERIOR: marchetaria elaborada, painéis pintados e enormes espelhos de parede.
FORMAS: curvas sinuosas em formas de S e C, arabescos e floreados semelhantes a fitas.
ESTILO: leve, gracioso e delicado.
CORES: branco, prata, ouro, tons suaves de rosa, verde e azul.
PALAVRAS-CHAVES FRANCESAS: “la grace” (elegância) e “lê goût” (gosto refinado)

IV – AUTORES REFERIDOS:

JEAN-ANTOINE WATTEAU (1684-1721)



“WATTEAU renovou a qualidade da graça. Já não é mais a graça da Antiguidade que encontramos em sua arte...A graça de WATTEAU é a consubstanciação da própria graça. Tem aquele toque indefinível que concede às mulheres um encanto, uma coqueteria, uma beleza que está muito além da beleza física. É aquela coisa sutil que parece ser o sorriso de um contorno, a alma de uma forma, a fisionomia espiritual da matéria.”

WATTEAU estudou a grande série de pinturas executadas por RUBENS em 1621-25 para Marie de Médici no Palácio de Luxemburgo, do qual Audran era o conservador.
O seu próprio estilo era, em muitos aspectos, uma tradução do de Rubens em termos líricos e modernos, deixando de fora a pompa e a grandiosidade.
Mas, WATTEAU não é, meramente, um Rubens em escala reduzida, nem a sua obra é toda feita de graça, pose e pares elegantes dando-se as mãos ou dançando num terraço ou jardim. Pelo contrário, a sua arte é intensamente pessoal e radicada na realidade, tanto a realidade da natureza visível como a realidade psicológica das emoções e desejos humanos, independentemente de sanções religiosas e mitológicas.
Os desenhos de WATTEAU são os registros dos seus estudos baseados na própria vida. Como homem, era irrequieto, difícil de tratar e morreu relativamente moço de tuberculose, condenado talvez a ser mais um espectador do que um participante na vida que observou to agudamente.
Ele transformou essa vida em termos poéticos, sem depender da grandiloqüência barroca. Pressente-se que essa transformação foi consciente, até parcialmente irônica. Aí reside a importância para WATTEAU do seu interesse no teatro. A sua pintura parece representar a vida convertida em arte, justamente, da mesma maneira como a vida é transformada em arte no palco, embora a sua obra nunca seja uma “encenação”
Significativamente, as figuras de WATTEAU raramente olham para o espectador; estão juntas aos pares e mutuamente absorvidas. E quando se voltam para enfrentar-nos, revelam-se como atores fazendo suas vênias ao público, atores nos papéis tradicionais da “Comedia dell’Arte” italiana: Pantaleão, o mercador, Isabela e Horácio, os amantes contrariados, Arlequim, o servo jovial e travesso, Mezetino, o músico, e, finalmente, Pierrot ou Gilles, o inocente ludibriado, a quem WATTEAU ergueu ao status de herói, talvez o único herói em toda a sua arte.
A tinta, que é manipulada com destreza mágica, ainda mais desprende as figuras da realidade cotidiana, tornando-as intocáveis e remotas. Impregnando tudo há um sentido de antevisão, de expectativa do acontecimento, de sentimentos que nunca são traduzidos em ação.
WATTEAU morreu em 1721, deixando apenas alguns sucessores medíocres no gênero que ele inventara: a “fête galante”.

“Festas venezianas”


“Embarque para a Ilha de Cítera” ou “Peregrinação a Cítera” (1717)


O artista idealizou essa delicada paisagem imaginária, habitada por graciosos aristocratas em flertes românticos, em cores imprecisas e atmosfera enevoada; onde reinam a eterna juventude e o amor. Talvez a obra-prima da pintura rococó, embora essa cena represente um regresso da ilha e não o embarque para ela.


“É amor, mas amor poético, amor que sonha e medita, amor moderno com seus anseios e suas grinaldas de melancolia”, afirmam os irmãos Goncourt.


“Les plaisirs du bal” (“Os prazeres da danças”), 1719




Este registro dos prazeres de uma vida campestre altamente civilizada foi tomado como um documento histórico por Hazlitt, que viu Luís XIV como o principal dançarino; mas, como em toda a obra de Watteau, o cenário e os trajes vagamente quinhentistas colocam o quadro no reino da fantasia arcádica.
 
Os seus desenhos têm toda a delicadeza e sensibilidade de suas pinturas, mas com um encanto adicional devido à falta de acabamento. Apesar do seu caráter fragmentário, os vários estudos de que as folhas se compõem sempre se conjugam harmoniosamente em cada página.
Em “Desenho de uma concha” (1710-15) feito por razão de documentação, embora a concha ilustrada pode quase ser considerada um microcosmo Rococó. Muitas das características do estilo estão expostas: a curva-S irregular, as frondes e picos, a assimetria, a sensação de desenvolvimento e o fascínio com o mundo natural e o exótico. Os motivos de conchas ocorrem frequentemente na decoração rococó alemã, embora não tanto na francesa.
 
FRANÇOIS BOUCHER (1703-70)


“A voluptuosidade é a essência do ideal de BOUCHER; o espírito de sua arte está na sua condensação espiritual. E até no tratamento dos nus convencionais da mitologia, que a luz e que mão habilidosa é a sua! Como é pura a sua imaginação mesmo quando o tema é indecoroso! E como é harmonioso o seu dom de composição, naturalmente adaptado, poderia parecer, para a disposição de corpos encantadores sobre nuvens roliças como colos de cisnes!”

BOUCHER pintou pastoras e pastores belamente vestidos entre árvores frondosas, nuvens espessas e ovelhas dóceis.
O seu estilo era extremamente superficial. Ele se recusava a pintar a vida, dizendo que a natureza era “verde demais e mal iluminada”. Seus bonitos quadros de nus em poses sedutoras fazem grande sucesso entre a aristocracia decadente.
Com BOUCHER, a nuvem do Olimpo converteu-se nos travesseiros e lençóis de uma cama setecentista; e Vênus e Diana tornaram-se símbolos sexuais.
O mundo de Vênus, na imaginação de BOUCHER, com suas ninfas e sereias, suas conchas, recifes e bancos de coral, água e espuma, era o acompanhamento perfeito dos esquemas de decoração do rococó.
As ondas e os nus brincalhões têm os mesmos contornos sinuosos, enquanto o azul frio do mar, o branco do resplendor dos borrifos de espuma, o verde brilhante das folhas e o rosado dos corpos produzem uma harmonia cromática tipicamente rococó.
Como um manipulador de composição, ele atenuou o Barroco de várias maneiras: os corpos agrupam-se e entrelaçam-se numa associação moderada e assimétrica; mas, contínua, à semelhança dos motivos decorativos num troféu rococó, deixando um espaço livre e irregular entre si.

“Retrato de Madame de Pompadour“



“Rapariga em repouso”




Odalisca ou Mademoiselle O'Murphy”



“Diana saindo do banho”

 
 
JEAN-HONORÉ FRAGONARD (1732-1806)


"A Inspiração" (1769), auto-retrato

 
 
 


Os quadros de FRAGONARD eram igualmente leves e excessivamente ataviados.

Continuou o estilo rococó até a Revolução, imune à influência do movimento neoclássico, embora sensível a algumas tendências românticas iniciais.
FRAGONARD pertenceu à fase de “sensibilité” que varreu toda a Europa originada na Inglaterra, na segunda metade do séc. XVIII.
Os títulos de alguns de seus quadros indicarão essa sua veia característica: “O beijo roubado”, “Cupido roubando a camisola” e “A recordação”.
Também adorava os jogos e os episódios pitorescos.
Árvores de folhagem verde prateado suave espraiam-se em repuxo contra o céu, enquanto moços e moças jogam, embaixo, num jardim italianizado.


“O balanço”


Em seu famoso “O balanço”, num gesto provocante, uma jovem sentada num balanço atira longe a sandália de cetim enquanto um admirador espia as suas calçolas de renda.


“O amoroso coroado, ou O concurso musical”

Nenhum comentário: