Cindy
Sherman nasceu em 19 de janeiro de 1954, em Glen Ridge. Logo após o seu nascimento, sua família se
transferiu para a cidade de Huntington, Long Island.
Estudou no
Buffalo State College entre 1972 e 1976, onde despertou o gosto pela pintura.
No entanto, sua limitação com essa arte, levou-a ao campo da fotografia, que
considerava como o meio de expressão apropriado à sociedade, dominada pelos
meios de comunicação.
“Não havia mais nada a dizer – sobre a
pintura”, ela relembrou mais tarde. “Eu
estava meticulosamente copiando a arte de outros e então eu me dei conta que eu
poderia somente usar uma câmera e colocar em prática uma ideia instantânea.”
Em 1976,
formou-se em Fotografia, iniciando sua carreira em Nova York, tornou-se uma das
grandes expoentes da arte contemporânea.
Nos anos setenta Cindy Sherman começou
a desenvolver seu percurso artístico em torno da fotografia como suporte das
muitas figuras passíveis de ser retratada a partir de sua própria pessoa,
assim, a artista realiza, por meio dela, uma denúncia dos lugares
estereotipados de sujeição destinados à mulher em nossa sociedade.
Ainda que, esses auto-retratos
assemelham-se a uma atitude narcisista, introspectiva e de sensualidade, a
artista esclarece que: “são retratos da
emoção personificada e não retrato meus. Tento fazer as pessoas reconhecerem
alguma coisa delas mesmas, e não minhas”.
Cindy Sherman empresta seu corpo em
prol da arte e trabalha em séries temáticas.
“Tento
sempre distanciar-me o mais que posso nas fotografias. Embora, quem sabe, seja
precisamente fazendo isso que eu crio um auto-retrato, fazendo essas coisas
totalmente loucas com esses personagens, diz, mas seria possível?”
A partir dessas obras, Sherman
levantou questões sobre a feminilidade na sociedade, na mídia e na arte. Para
criar suas fotografias, Sherman assume várias funções: fotógrafa, modelo,
maquiadora, estilista, cabeleireira e com esses apetrechos cria uma diversidade
de quadros vivos e personagens perturbadoras.
Uma de suas séries mais famosas, “Untitled
Film Stills”, desenvolvida de 1977 a 1980, contém 69 fotografias em preto e
branco ou colorido, de personagens femininas sempre representadas pela própria
artista. Essas imagens nos lembram de forma indireta as divas cinematográficas
hollywoodianas ou pinturas de grandes mestres, dos anos 40 e 50, capturadas em
cenas de filmes “noir”, ou então em momentos de descontração na intimidade de
suas casas.
Essas figuras aparecem sempre
solitárias e nos remetem à sensualidade, ao luxo, bem como ao suspense, a
solidão e ao conflito promovido pelas circunstâncias nas quais se encontram.
Cindy Sherman, com essa série,
denúncia de forma irônica os diversos estereótipos reservados às mulheres que
povoam o imaginário de nossa época, marcado pela influência midiática, dos
filmes às propagandas televisivas.
O reconhecimento da artista veio com
essa primeira série, como também, a sua popularidade junto ao movimento feminista
e prolongou-se durante toda sua carreira.
A força dessas imagens e sua
influência na construção das identidades são retratadas sem mencionar de quem
se trata, ou em que circunstância. Além de dispor suas personagens em posições
nas quais elas parecem estar sendo olhadas e isso implica a co-participação do
espectador da obra, encerrando a imagem em si mesma ou se abre para o
espectador através do artifício do olhar.
Em suas séries subsequentes, como as
“Rear Screen Projections” e as “Centerfolds or Horizontals”, o absurdo atinge o
ápice do horror. A artista passa a se utilizar de revelações em grande formato,
inspiradas ora nas emissões televisivas com seus cenários visivelmente falsos
ora confinadas a um movimento da câmera que as coloca nos ângulos e posições
frequentemente utilizados em revistas pornográficas.
Na série “Fashion Photos” encontra-se
fotografias inspiradas pelos editoriais de moda, em personagens apavorantes,
grotescas, estranhas, loucas e sinistras. É como se retratasse um desfile de
horror e a decadência da mulher, destituída de todas as glamourosas imagens.
Nas séries “Fairy Tales”, “Disasters”,
“Civil War”, “Sex Pictures”, “Horror and Surrealist Pictures”, “Masks” e “Broken
Dolls” a ironia dá lugar ao horror e atinge à completa dissolução da figura
humana, relegados aos dejetos, às excrescências, à carne, ao sangue, à sujeira,
ao informe.
Utilizando-se de uma iluminação
sombria e da visão de figuras burlescas, criadas com o uso de máscaras
sobrepostas em camadas e próteses, aproximou o feminino do grotesco como
absurdo, simulacro, revelação da farsa da revelação, automatismo, inumanidade
mascarada de humano e tudo o mais que seu desfile de horrores e decadência é
capaz de produzir.
Dessa forma, somos reenviados aos
cenários e personagens desprovidos de sentido da alusão aos contos de fada em
seu viés aterrorizante, de amontoado de bonecos, de monstros e combinação de
pedaços de manequins colocadas em poses sexuais, que remetem ao estranho.
Em “Masks” e “Broken Dolls” o inumano
de máscaras distorcidas e mutiladas não esconde mais nada detrás de si. A
própria máscara tem vida do mesmo modo como as bonecas despedaçadas e colocadas
em posições obscenas também soam absurdas, desligadas de qualquer possibilidade
de vinculação com algo da esfera do humano.
Nessas séries não há mais a sedução da
figura com seu olhar perdido nas fotografias anteriores. Mantém-se, no entanto,
um desconforto, que é aumentado pela artificialidade da composição tão
explicitamente revelada quanto o sexo das figuras fotografadas.
Na série “Bus Riders”, a artista
apresenta seus personagens com suas vestimentas, sentados em um barquinho, com
um disparador da câmera fotográfica nas mãos. O irônico está em que aquelas
figuras jovens, velhas, homens e mulheres se desconstroem ante os olhos do
espectador desde que constatemos o disparador da máquina.
A ironia em Sherman está em apresentar
uma cena e simultaneamente a construção da cena como farsa da composição
artística.
Já em “History Portraits” ou “Old
Masters”, a artista presta tributo aos grandes mestres da pintura, reproduzindo
em suas criações fotográficas aquilo que parecem ser telas de pintores dos
séculos precedentes, que aparecem como referência nas formas da composição, no
uso das cores e da luz, e principalmente nos motivos ou temas de cada obra:
madonas, personagens mitológicos ou nobres com suas ricas vestimentas e
adornos.
Em 2004, o brilho irrecuperável das
primeiras séries reaparece aqui como cru e franca decadência na série “Clowns”.
Nela encontramos figuras mais grotescas do que ridículas, com seus sorrisos
assustadores, imagens fantasmagóricas frente a um fundo de cores fortes e
marcantes, excesso de vivacidade de onde brotam como máscaras da morte, satirizando
uma suposta felicidade.
Os clowns retornam os objetivos
principais da arte de Sherman: personificação do grotesco e da ironia, que sorriem
para o espectador de forma terrível e ameaçadora.
Em 2011, uma de suas fotos foi vendida
na casa de leilões Christie’s por 3,9 milhões de dólares, tornando-se, na
época, a mais cara fotografia vendida em um leilão de arte.