quarta-feira, 17 de abril de 2024

“PROSAS SEGUIDAS DE ODES MÍNIMAS”, de José Paulo Paes

 

“PROSAS SEGUIDAS DE ODES MÍNIMAS”, de José Paulo Paes

Publicado em 1992, “Prosas seguidas de odes mínimas”, de José Paulo Paes, pertence ao 3º Tempo Modernista e é composto de duas partes contendo vinte textos em prosa poética e treze odes curtas (à exceção "A minha Perna").

O autor recorre, nos títulos de poemas a uma nomenclatura da lírica tradicional: canção, noturno, balada, ode, e abordam aspectos memorialísticos, literários, existenciais e sociais, e têm a presença constante da esposa do autor, Dora. A obra começa falando de morte e termina falando em nascimento, mostrando, ao que parece ser, uma experiência de separação.

O livro é uma mistura de temas que vão do lirismo à crítica política e fazem com que o leitor tenha uma ideia geral da obra. Por esses motivos é um dos livros mais completos. O autor repassa por toda sua trajetória e é como se tivesse a preocupação de lapidar novamente toda sua forma e estilo.

Em “Escolha de túmulo”, coloca o pós-morte como uma nova vida, um novo vôo. Faz mais uma nova leitura em “Canção de exílio” do poema de Gonçalves Dias. Existe a presença da figura de seu pai no poema “Um retrato”, uma homenagem que também contém a morte como tema de reflexão. Esse mesmo tema encontra-se embutido no poema “Reencontro”, onde o autor se encontra em sonho com o teatrólogo Osman Lins, falecido anos atrás. O crédito de maior destaque pode ser dado ao poema: “À minha perna esquerda”. Trata-se de uma sequência de poemetos de características epigramáticas, num total de sete, onde conta sobre si mesmo de maneira tétrica e sarcástica sobre a perda de sua perna esquerda. É forte a intenção interpretativa que se embute no inevitável sacrifício. Nos poemas finais, tece uma quase crônica dos detalhes, sintetiza no cotidiano de objetos e lugares sua poética de forma condensada e rebuscada para dentro de si mesmo.

Contém nesta coletânea: “Escolha de túmulo”, “Noturno”, “Canção de exílio”, “Um retrato”, “Outro retrato”, “A casa”, “Iniciação”, “Nana para Glaura”, “Balancete”, “Reencontro”, “Balada do Belas-Artes”, “À minha perna esquerda”, “À bengala”, “Aos óculos”, “À tinta de escrever”, “Ao shopping center”, “Ao espelho”, “Ao alfinete” e “A um recém-nascido”.

É uma obra de caráter extremamente conciso, que remonta em alguns aspectos à literatura de Oswald de Andrade, como a paródia, o trocadilho, o humor, a poesia sintética, o espírito satírico. No entanto, o poeta não se aproxima apenas de Oswald de Andrade. Sente-se nele uma familiaridade com Drummond, principalmente no aspecto gauche de alguns poemas. Basta ler o texto "Canção do adolescente" transcrito abaixo:

Se mais bem olhardes
notareis que as rugas
umas são postiças
outras literárias.
Notareis ainda
o que mais escondo:
a descontinuidade
do meu corpo híbrido.
Quando corto a rua
para me ocultar
as mulheres riem
(sempre tão agudas!)
do meu corpo.
Que força macabra
misturou pedaços
de criança e homem
para me criar?
Se quereis salvar-me
desta anatomia,
batizai-me depressa
com as inefáveis
as assustadoras
águas do mundo.

Neste poema o eu-lírico se descreve como uma junção um tanto desajeitada do adolescente com o amadurecido, criando um híbrido dotado de uma anatomia que inspira compaixão ou riso.

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